23 de outubro de 2009

Religião e Estado

Aqui postamos que a percepção que advém quando estudamos a declaração de Jesus em São Marcos, capítulo 12.13-17, sobre o dar a César e o dar a Deus, está bem longe da convencional "separação entre religião e política". De fato, é impossível pensar em tais termos para aquela época. Antes, a declaração é um desafio radical à pessoa tomar a fé na integralidade de toda sua vida. Não há compartimentos separados, e a fé não é "questão de fórum íntimo". Não para Jesus, não para o cristianismo.

Contudo, esta questão da separação entre religião e estado é importantíssima de ser frisada dado o histórico e polêmicas no cenário atual brasileiro, com clientelismo e manipulação da fé.

Declaração Teológica de Barmen (elaborada pela Igreja Confessante, que resistiu às pressões nazistas na Alemanha):

VI Artigo:
A Escritura nos diz que o Estado tem o dever, conforme ordem divina, de zelar pela justiça e pela paz no mundo ainda que não redimido, no qual também vive a Igreja, segundo o padrão de julgamento e capacidade humana com emprego da intimidação e exercício da força. A Igreja reconhece o benefício dessa ordem divina com gratidão e reverência a Deus. Lembra a existência do Reino de Deus, dos mandamentos e da justiça divina, chamando, dessa forma a atenção para a responsabilidade de governantes e governados. Ela confia no poder da Palavra e lhe presta obediência, mediante a qual Deus sustenta todas as coisas.

Rejeitamos a falsa doutrina de que o Estado poderia ultrapassar a sua missão especifica, tornando-se uma directriz única e totalitária da existência humana, podendo também cumprir desse modo, a missão confiada à Igreja.

Rejeitamos a falsa doutrina de que a Igreja poderia e deveria, ultrapassando a sua missão específica, apropriar-se das características, dos deveres e das dignidades estatais, tornando-se assim, ela mesma, um órgão do Estado.


No século IV, Constâncio, sobrinho de Constantino, fora um imperador ariano que perseguia os cristãos católico-ortodoxos. Ao condenar Atanásio em Milão – 355 – expôs sua concepção sobre igreja/estado, para a Igreja:

Aceite-se minha vontade entre vós e seja ela vossa lei como é lei para os bispos sírios (arianos).

Ósio, bispo de Córdoba (256-357 d.C.) redigiu para Constâncio o que poderia ser considerado o primeiro manifesto, melhor, um protótipo, para a autonomia das esferas:
(...) Abandonai, suplico-vos, os vossos procedimentos. Lembrai que também vós sois mortal; temei o dia do juízo e guardai-vos puro na perspectiva daquele dia. Não interfirais em matérias eclesiásticas, nem nos instruas em semelhante questões, mas a respeito delas aprendei de nós. Deus colocou em vossas mãos o império, mas as coisas de Sua Igreja confiou a nós. Se alguém vos arrebatais o império, resistiria à ordem divina; do mesmo modo, deveríeis, vós e os vossos, temer que, assumindo o governo da Igreja, vos torneis réus de ofensa grave. “Daí a César o que é de César e a Deus o que é de Deus”. Nós não temos permissão para exercer o poder humano e vós, César, não tendes autoridade para queimar incenso. Assim vos escrevo por se tratar de vossa própria salvação.

Apesar de que, já naquele tempo podemos ver o anacronismo com a passagem do dito de Jesus sobre as moedas, ele antevera uma linha de raciocínio profética que julga a história posterior.



São extremamente delicadas as situações, em que uma norma especificamente religiosa se torna, ou tende a tornar-se, lei do Estado, sem que se tenha na devida conta a distinção entre as competências da religião e as da sociedade política. Identificar a lei religiosa com a civil pode efectivamente sufocar a liberdade religiosa e até limitar ou negar outros direitos humanos inalienáveis.
João Paulo II, Mensagem para a celebração do Dia Mundial da Paz de 1991: “Se queres a paz, respeita a consciência de cada homem”, IV, AAS 83 (1991) 410-421.

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