22 de dezembro de 2012

Re-pousando no Magnificat

Lucas 1,46-55


Esta quem entoou este hino, é Maria. A Santa Maria...

Que Maria diferente nos é apresentada por Lucas, não é mesmo?

Maria valente, de pé no chão, Maria com sangue circulando nas veias, no rosto, com vento na voz... Maria valente, Maria de paixão, febril, Maria indignada com a condição do mundo... não aquela Maria apática, complacente, fria....

Infelizmente, a ideia de Maria está presa entre dois extremos. A Maria ignorada ou recusada, em grande parte dos protestantismos.... a Maria divinizada, pacata e condescendente do catolicismo popular...

E aqui vemos um pouco mais diretamente outra Santa Maria, vindo das páginas vivas das Escrituras.

Ela canta de forma vibrante e arrebatada um hino do seu povo, que tinha raízes em um antigo cântico tradicional, o cântico de Ana, em I Samuel 2,1-10. Que falava à alma da nação. Traduzia a esperança dos pobres e condenava a arrogância das nações, exaltando a libertação e advertindo que os opressores ainda seriam humilhados. No “Magnificat”, o hino fora retrabalhado, incorporando menções a passagens de salmos, profetas (como Habacuque, Sofonias, Isaías, Miqueias), passagens que ecoavam a expectativa do triunfo final da liberdade do povo, conquistado através de Deus, ante o jugo dos dominadores. Ana também comemorava, na antiga canção, quando o Senhor abrira seu útero estéril. Como acontecera com Izabel, prima de Maria.

Um hino judaico que logo em seus primórdios a Igreja Cristã incorpora para sua vida. Ali Maria vibra e traz as maravilhas fantásticas que estavam acontecendo consigo e em sua família – a prima Izabel, idosa, esperando um filho que já se anunciava ser alguém especial – para todo um cenário do drama, aflições e esperanças de seu povo.

Sem esquecer de si mesma, enxerga ainda assim muito além de si.

Hoje, é meio triste que as pessoas cultivem uma fé individualista e egocêntrica; e uma das formas em que isto se manifesta é canalizarem toda sua relação e expectativa em Deus para a salvação da sua alma, para “ir para o Céu”.... às vezes, pior, para ter sucesso individual na sociedade.

Ali, o regozijo não era de agradecer porque iria para o “Céu”, mas por participar do plano de Deus de curar o mundo de toda injustiça.

Às vezes ficamos intrigados com uma questão... qual teria sido o papel da mãe, Maria, na formação da personalidade e caráter de Jesus? Abre-se espaço para qualquer invenção sem base da imaginação...

Neste hino, temos as pistas... fortes!

Vejamos alguns recortes dele:

48-9: “gerações me considerarão bem-aventurada”...

O que lembra? As bem-aventuranças proclamadas por Jesus. Podemos ver como há uma sintonia fina, onde elas constam no evangelho de Lucas, de 6 a 26:
Maria disse: “contemplou na humildade de tua serva” ..."meu espírito se alegrou no Senhor...”... “misericórdia sobre os que o temem” - é bem o espírito das “Bem-aventuranças”, as quais Jesus proferia como motivação para a fé dos mais pobres e humildes.

Ainda temos mais pontos em comum: 52-"derrubou do trono os poderosos e exaltou os humildes”...        53 - "encheu de bens os famintos, despediu vazios os ricos”.

“Bem-aventurados vós, os pobres, porque vosso é o Reinado de Deus. Bem-aventurados vós, que agora tendes fome, porque sereis saciados. Bem-aventurados vós, que agora chorais, porque haveis de rir” (…) “Mas ai de vós, ricos, porque já tendes a vossa consolação! Ai de vós, que estais saciados, porque tereis fome! Ai de vós, que agora rides, porque conhecereis o luto e as lágrimas!”

Vemos que a espiritualidade de Jesus herdou de Maria o inconformismo com este mundo, e o anseio de transformação; a consciência de não usar o nome de Deus para legitimar o atual estado de coisas, mas apontar o dedo nas feridas mostrando que a injustiça não terá a palavra final, mas passará...

A VisitaçãoIl Guercino


Na tradição anglicana, os santos são honrados como peças-chave para a construção do Reinado de Deus na história, por sua importância para a vida e doutrina da Igreja, pelos seus testemunhos de vida especiais. Maria tem um lugar especial aí, em que lhe é direcionada grande honra. Que possamos fazê-lo, dando-lhe grande honra, aprendendo com ela, perseverando junto com ela, compartilhando dos anseios dela.

27 de novembro de 2012

Ruah





Emissário de para lá, estás
além do onde, do quando e do enquanto.
Sopro de trevas, se perfaz
em densidade absoluta, pavor sem alento.

É a cama de sua morada, assaz
sem fosco, luz que emudece o espanto.
Sombra, é tudo o que não és, veraz
tem seu corpo, no reflexo de seu vento.

É a pulsão, para o avanço e para o detrás
vem refluxo, o definir, o portanto.
Sótão do que não foi em vão, farás
quem rebrota do jardim, contento.

Eleva o repouso, desassossego mordaz
contém o vácuo, o Todo, o conquanto.
Sonda o inescrutável, quietude loquaz
bem no abismo, relega o abandono ao relento.

É a solicitude da boca do bebê, vivaz
neném que assim vai ao encontro do encanto.
Sorve a candura da ossada, na miragem fugaz
sustém de pé, és a angústia, és o unguento.



                              música: Adagio Ma Non Troppo, Dvorák

3 de novembro de 2012

Mensagem para o Domingo de Todos os Santos e Todas as Santas

Leituras Bíblicas

Sirácida 2,1-9
Efésios 1, 15-23
São Lucas 6,20-26.

"Um homem muito rico, ao morrer, deixou suas terras para seus filhos. Todos eles receberam terras férteis e belas, com exceção do mais novo, para quem sobrou um charco inútil para a agricultura. Seus amigos se entristeceram com isso e o visitaram, lamentando a injustiça que lhe havia sido feita. Mas ele só lhes disse uma coisa: 'Se é bom ou se é mal, só o futuro dirá'.

No ano seguinte, uma seca terrível se abateu sobre o país, e as terras dos seus irmãos foram devastadas: Mas o charco do irmão mais novo se transformou em um oásis fértil e belo. Ele ficou rico e comprou um lindo cavalo branco por um preço altíssimo. Seus amigos organizaram uma festa porque coisa tão maravilhosa tinha acontecido. Mas dele só ouviram uma coisa:'Se é bom ou se é mal, só o futuro dirá'.

No dia seguinte seu cavalo de raça fugiu e foi grande tristeza. Seus amigos vieram e lamentaram o acontecido. Mas o que o homem lhes disse foi: 'Se é bom ou se é mal, só o futuro dirá'.

Passado sete dias o cavalo voltou trazendo consigo dez lindos cavalos selvagens. Vieram os amigos celebrar essa nova riqueza, mas o que ouviram foram as palavras de sempre: 'Se é bom ou se é mal, só o futuro dirá'.

No dia seguinte seu filho sem juízo montou um cavalo selvagem. O cavalo corcoveou e o lançou longe. O moço quebrou uma perna. Voltaram os amigos para lamentar as desgraças: 'Se é bom ou se é mal, só o futuro dirá' o pai o repetiu. Passado poucos dias, vieram os soldados o rei para levar os jovens para a guerra. Todos os moços tiveram de partir, menos o seu filho de perna quebrada, os amigos se alegraram e vieram festejar. O pai viu tudo e só disse uma coisa: 'Se é bom ou se é mal, só o futuro dirá'.

Assim termina a história, sem fim e com reticências (...) Ela poderá ser continuada, indefinidamente. E ao contá-la, é como se contasse a estória de minha vida.

Tanto os meus fracassos quanto as minhas vitórias duraram pouco. Não há nenhuma vitória profissional ou amorosa que garanta que a vida finalmente se arranjou e nenhuma derrota que seja a condenação final. As vitórias se desfazem como castelos atingidos pelas ondas, e as derrotas se transformam em momentos que prenunciam um começo novo. Enquanto a morte não nos tocar, pois só ela é definitiva, a sabedoria nos diz que vivemos sempre à mercê do imprevisível dos acidentes. 'Se é bom ou se é mau, só o futuro dirá'. "

em "As Melhores Crônicas de Rubem Alves", pg. 82

TEMA: O “Ainda Não” como motivo de viver o “Agora”

Incerteza inerente à vida. O risco do qual não se tem como fugir. Tentação de renegar a fé, de não suportar nenhuma dor ou mau em nome do bem, em “jogar o jogo” para ser bem estabelecido no mundo. Não temos garantias. Viver a virtude agora não oferece nenhum penhor de que aqui seremos bem-sucedidos ou estamos livre de quaisquer desgraças.

Então, pra quê perseverar? Pra quê arriscar? Nossas decepções e frustrações não nos dão as devidas desculpas para sermos condescendentes, e de consciência limpa, buscarmos “levar vantagem em tudo”, porque afinal, não faz sentido nos expormos a “fracassarmos” aqui?

Definitivamente, os padrões do chamado cristão, do sentido de viver chamado por Jesus, não são as chaves do sucesso aqui; a cruz, foi o exemplo de maior, fraqueza, humilhação e derrota para aquele mundo. Para um cidadão romano, só era utilizada caso fosse culpado de uma nojenta traição à pátria e servia para dizer que chegara ao extremo da vergonha. Era o castigo apropriado para escravos revoltosos, o serville suplicium.

Por isso o cristianismo tem sido alvo de ataques ao longo da história, como uma religião de fracos. Que usam a desculpa da esperança no porvir para aceitar fracassos do agora.

Essa acusação não esteve presente apenas no mundo moderno, embora tenha ganhado frequência nele com suas promessas de que o progresso da humanidade é inevitável.

Um grafite anti-cristão do segundo século de Roma, bem conhecido entre os historiadores que estudam o período, mostra um homem crucificado grosseiramente elaborado, com uma cabeça de burro, em que está uma figura humana, e sob este um escárnio rabiscado: "Alexamenos adora o seu Deus" [Alexamenos sebetai ton theon].

Mas o que é loucura no mundo, Deus o escolheu para confundir os sábios; e o que é fraqueza no mundo, Deus o escolheu para confundir o que é forte; e, o que no mundo é insignificante e desprezado, o que não é, Deus escolheu para reduzir a nada o que é.  I Coríntios, 1, 27-28.

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No mundo dos inícios do cristianismo, a convicção geral das pessoas era de que toda a existência era regida e movida pela força do Destino. Se remetia sua expressão às estrelas, e ninguém escaparia dele. Nem os deuses estavam a altura do Destino. Muito da busca da sabedoria, seja mística, religiosa, filosófica, se dava em entender o destino saber aproveitá-lo o possível.

É estranho revisitarmos a história e pensar nestes termos. Muitas vezes parece que está certo. Coisas e situações costumam se repetir, com leves mudanças que só realçam os pontos em comum. Parece que não conseguimos escapar de certos padrões. Por outro lado, por diversas vezes se percebeu que o mundo estava seguindo uma tendência, todos julgavam tudo no mundo, as pessoas, ideias, crenças, comportamentos, enquanto utilidade ou obstáculo haveria de proporcionar para essa tendência. Achou-se ter captado a sintonia da realidade. Por diversas vezes na vida também é assim. Seja para o bem ou para o mal, enxergamos um horizonte como se fosse apenas uma linha de consequência em que desaguou o curso do rio que achamos estar a nado nele, derivado de uma leitura que fazemos da situação.

Até que vem o inesperado e sacode tudo. Aí, a história já começa a parecer um bêbado andando e trupicando, fazendo troça de tudo. Parece que tem alguém brincando com nossa vida.

Vamos continuar sempre ouvindo um caso sobre “progresso da humanidade”. E quanta coisa, quantas vidas já fora sacrificadas em nome disso? Seja para ajudar, acelerar o progresso, ou não atrapalhar. Contudo, por diversas vezes, as guerras mais monstruosas vieram depois de períodos de grande otimismo e louvor pelos tratados de paz, como a Guerra dos Trinta Anos, na Europa, depois do Tratado de Paz de Westfalia, quando todos achavam que finalmente o caos do mundo iria se consertar.

Reluta-se a admitir que a transitoriedade, que o fato de que vivemos uma realidade sempre transitória, passageira, faz com que não possamos dizer que em algum momento teremos um cenário para o qual apontaremos e diremos “é assim que as coisas são”. Não vivemos numa existência marcada pela estabilidade, embora ansiamos e buscamos trazê-la à força. Remédios, exercícios, livros, conselhos, buscas e fugas, fugindo da incerteza e querendo uma estabilidade para firmar os passos, deitarmos, estarmos seguros.

Mas qualquer segurança neste mundo é frágil. Como a imagem de uma areia que se querermos apertar as mãos, ela escorre. Por isto São Paulo escreveu, em I Coríntios 15, 19: Se pusermos nossa esperança em Cristo somente para esta vida, somos as pessoas mais dignas de piedade.

Por isto a crença na vida eterna. No caso da fé cristã, a crença na renovação do Universo, numa Nova Criação, em que tomaremos parte na sua nova realidade, não sujeita mais à decomposição, ressurretos. Nossa fé na ressurreição que participaremos juntos com toda a Criação de Deus.

Não é de forma alguma uma crença para alienar e tornar covarde as pessoas. Muito pelo contrário. É a única esperança de que podemos desafiar o absurdo, na vida, na história, e não ficaremos frustrados. Diversas pessoas lutaram contra atrocidades, males, injustiças, e não viram resultado algum. Diversas pessoas tentaram, em sua vida, não pagar o mal com o mal, abrir mão de um certo sucesso e prestígio não vendendo a alma para tal, não caindo em jogos sórdidos, e pelas aparências do mundo, ficaram frustradas enquanto outras chegaram ao topo. Diversas pessoas se pautaram pela justiça, amor, integridade, por servir ao próximo, por não buscar saciar o anseio de dominação sobre o outro, e o veredito que o mundo deu foi: fracasso. Fraqueza. Estupidez. Loucura. Não vale a pena! Não vale a pena!

Muito além então de ser um apelo alienante, para as pessoas se resignarem com os augúrios e males da vida e do mundo, esperando pelo “Céu” - a Redenção e Reconciliação da Existência com Deus no Renovar dos Tempos - serve de motivação para independente do que for, podermos não nos entregarmos a isto, não caracterizarmos nenhuma condição atual como definitiva, pois Deus não deixará nada perdido, esgotado, desperdiçado mas a coragem de não se entregar e se definir pela lógica do mundo, e todos os atos de amor machucados pelo desamor, serão matérias-primas para a construção da Verdadeira Realidade Eterna, por parte do próprio Deus. Nada será desperdiçado ou em vão.

Sem esse olhar da eternidade, essa é a realidade crua. É muita bobagem querer disfarçar dizendo que a luta dessas pessoas não se perdeu, continua viva em não sei onde. Não. Porque ninguém sabe se a qualquer momento, tudo vai se frustrar. Não se tem garantia de que tudo não será em vão. E a pessoa não está ciente de nada se está na memória de não sei quem. Não está vendo, sentindo, nada. E para tantas pessoas que são lembradas, muito mais caíram no limbo do esquecimento. Outras tantas foram traídas. E quem busca continuar o legado delas, pode também morrer a qualquer momento. Até mesmo a daqui a pouco.


Por que nos expomos continuamente ao perigo? Dia após dia estou morrendo. Juro, irmãos, pelo orgulho que sinto de vós diante de Cristo Jesus Senhor nosso. Se por motivos humanos lutei com as feras em Éfeso, de que me serviu? Se os mortos não ressuscitam, comamos e bebamos, pois amanhã morreremos. I Co. 15, 30-32.

Jesus, com as bem-aventuranças, está revertendo, pondo de cabeça-para-baixo os valores consagrados, “normais”, aqui na sociedade terrena. Em comparação ao projeto de Deus para seu Cosmo renovado, estamos numa era “torta”, em um mundo “torto”; e os valores norteadores deste projeto divino, atualmente, são “tortos” para este mundo. Bonitinhos e gostosinhos às vezes para se sentir no fundo do peito ou na ponta da colher, mas não para pautar a “vida real”. A esperança cristã manifestada em Jesus Cristo é que a vida, a existência, e estes valores finalmente se “ajustarão” na ressurreição, e então, não hão de cair no Nada, não estarão perdidos para sempre, todos os atos de desafio ao mundo feitos pela mais humilde e esquecida figura humana. Se converterão em fôlego de vida, um fôlego que não se acaba, alimentados por uma chama que não se apaga, a que criou a primeira fagulha do primeiro sol, a energia do Espírito de Deus.


Este Espírito vem com amor e graça entrar em comunhão com a gente, nos chamando a Si, já no agora. E cremos estar presentes aqui. É nessa comunhão com Ele que nos unimos hoje aos Santos e Santas de Deus na história, os de dentro da Igreja, e os de fora da Igreja, incluindo aqueles que só Deus conhece. Na compreensão da tradição anglicana, comemoramos e prestamos homenagem e deferência aos Santos e Santas, não como pessoas dotadas de um poder especial para intermediar entre nós e o Sagrado, nem para operar feitos miraculosos. Mas como exemplos de pessoas que foram pecadores e pecadoras como nós, imperfeitos, falhos, mas cuja vida teve um peso, significado ou papel edificador importante para a história da igreja ou para o testemunho cristão no mundo, glorificando Deus e servindo para fazer seu Reinado mais presente no mundo.

Que esta reflexão seja trabalhada pelo Espírito, para que em Cristo, nenhum feito ou testemunho destes irmãos e irmãs, seja em vão. Honremo-los.

30 de setembro de 2012

A Visão, O Chamado

No ano em que morreu o rei Uzias, eu vi também ao Senhor assentado sobre um alto e sublime trono; e o seu séquito enchia o templo.
Serafins estavam por cima dele; cada um tinha seis asas; com duas cobriam os seus rostos, e com duas cobriam os seus pés, e com duas voavam.
E clamavam uns aos outros, dizendo: Santo, Santo, Santo é o SENHOR dos Exércitos; toda a terra está cheia da sua glória.
E os umbrais das portas se moveram à voz do que clamava, e a casa se encheu de fumaça.
Então disse eu: Ai de mim! Pois estou perdido; porque sou um homem de lábios impuros, e habito no meio de um povo de impuros lábios; os meus olhos viram o Rei, o SENHOR dos Exércitos.
Porém um dos serafins voou para mim, trazendo na sua mão uma brasa viva, que tirara do altar com uma tenaz;
E com a brasa tocou a minha boca, e disse: Eis que isto tocou os teus lábios; e a tua iniqüidade foi tirada, e expiado o teu pecado.
Depois disto ouvi a voz do Senhor, que dizia: A quem enviarei, e quem há de ir por nós? Então disse eu: Eis-me aqui, envia-me a mim. 
Isaías 6:1-8
O Chamado de Isaías - Giovan Battista

Aleksandr Pushkin – poeta e teatralista russo (1799 – 1837)


O Profeta

Tradução de Boris Schnaiderman e Nelson Ascher


Num ermo, eu de âmago sedento
já me arrastava e, frente a mim,
surgiu com seis asas ao vento,
na encruzilhada, um serafim;
ele me abriu, com dedos vagos
qual sono, os olhos que, pressagos,
tudo abarcaram com presteza
que nem olhar de águia surpresa;
ele tocou-me cada ouvido
e ambos se encheram de alarido:
ouvi mover-se o firmamento,
anjos cruzando o céu, rasteiras
criaturas sob o mar e o lento
crescer, no vale, das videiras.
Junto a meus lábios, rasgou minha
língua arrogante, que não tinha,
salvo enganar, qualquer intuito,
da boca fria onde, depois,
com mão sangrenta ele me pôs
um aguilhão de ofídio arguto.
Vibrando o gládio com porfia,
tirou-me o coração do peito
e colocou carvão que ardia
dentro do meu tórax desfeito.
Jazendo eu hirto no deserto,
o Senhor disse-me: "Olho aberto,
de pé, profeta e, com teu verbo,
cruzando as terras, os oceanos,
cheio do meu afã soberbo,
inflama os corações humanos!"

17 de setembro de 2012

Arvo Part - Magnificat

Belíssima composição tendo como tema o "Magnificat" de Maria, apresentado no Evangelho Segundo São Lucas. Para um profundo mergulho espiritual...

2 de setembro de 2012

Escapismo, Batalha e as Trevas do Ar

Finalmente, fortalecei-vos no Senhor e na força do seu poder. Revesti a armadura de Deus para poder resistires às insídias do diabo. Pois não lutais contra carne e sangue, mas contra as Autoridades, contra os Soberanos, contra os Dominadores das trevas deste mundo, contra os espíritos do mal que povoam o ar. Portanto, tomai as armaduras de Deus, para poderem resistir no dia mau e saírem firmes de todo o combate. Cingi os rins com a verdade e revesti-vos da couraça da justiça, calçai as sandálias com o zelo para com o evangelho da paz, empunhando sempre o escudo da fé, com o qual se apagarão as lanças inflamadas do Mal. Tomai o capacete da salvação e espada do Espírito, que é a palavra de Deus.

Permanentes na oração e súplica, orai constantemente no Espírito; para isso, vigiai com toda a perseverança, rezando por todos os consagrados.
Efésios, 6,10-20

Há um tempo em que a maioria dos especialistas técnicos considera que o autor do livro “Aos Efésios”, do Novo Testamento, não é o apóstolo Paulo. Não temos uma explicação de consenso ainda a respeito desta autoria. Minha posição é de que seus discípulos, seja ainda com o apóstolo em vida, autorizando, seja após sua morte, retrabalharam a Epístola aos Colossenses, para aplicá-la, da especificidade desta comunidade, para a Ásia Menor em geral considerando a pertinência da sua pauta para as igrejas da região. Daí o enfoque dela, menos cristológico, ou seja, uma ênfase menor sobre a natureza universal de Cristo, para mudar as ênfases eclesiológicas, de igrejas locais para a natureza universal da Igreja de Cristo.

Ele é profundamente marcado por traços do imaginário intelectual apocalíptico judaico, depositário de heranças como constante no Livro de Ezequiel, Joel, Daniel, etc. Nesta tradição, se ressaltava as Forças do Mal como figuras e poderes cósmicos, atuando nos sistemas sociais humanos, disputando o controle e destino final da História.

Mais cedo neste livro neotestamentário, no primeiro capítulo, versículos 19-20, fala-se do Poder de Deus operando na história, através de Cristo, suplantando as forças diabólicas através da sua Ressurreição, completando o desfecho da história com a consumação de Seu Reinado em uma Terra transformada.

O psicólogo social Eric Fromm cunhou o conceito de “caráter social” para assinalar a energia psícossomática canalizada nos contornos dos padrões que um sistema social requer para funcionar. Nosso sistema histórico hoje tem como eixo a acumulação autorreplicante de capital... “acumulai, acumulai, assim dizem a Lei e os Profetas” (Karl Marx)... O lucro efetivamente capitalista é o lucro extraordinário, situado num patamar acima da média do mercado. Rompe com qualquer limite ou constrangimento. O indivíduo, para o sistema, existe em função do quanto contribui para maximizar, para a regularidade e inexorabilidade disto, os que falham são deixados para trás e existe uma rede de artifícios para fazê-lo se sentir inferiorizado e descartável. Este dínamo impulsona as pessoas e gera cargas simbólicas e psicológicas que influenciam o comportamento, tendendo a aumentar o egoísmo implacável, a ardilosidade, trapaça, desconfiança e falta de amor; “naturaliza” isto. Está por traz de todos os processos que sustentam este sistema. Por vezes, parece ter vontade própria, consciência, sabendo aprender, recuar, contra-atacar... Sua fome é insaciável.

Sem disciplina espiritual, oração e silêncio, silêncio e escuta, sem uma certa “ritualidade do Sagrado” - não mecânica – de forma a nos organizar na integralidade do nosso ser, para abrirmo-nos e entregarmo-nos, sermos preenchidos e impulsionados pela e para ação da Força do Bem Maior, que provém da vontade de Deus, nossa luta no mundo é um “bater-cabeças”. E o mal pode até este nosso pugnar contra nós mesmos, pois por fora nos faremos de idealistas, “pessoas boas”, virtuosas, porque cumprimos os códigos, proferimo-los; os jargões de quem contende pelo bem, mascarando e cuidando das maldades que brotam em nosso interior. Escapando de enfrentá-las.

Escapismo...que palavra galhofeira!

"Não derrame lágrimas", por Denis Peterson

Dizem que devemos deixar de lado fantasias e imaginação, porque são coisas escapistas, e costumamos ler ou ouvir que as artes, as artes devem nos “trazer para” a vida real, ou “falar da vida real”, ou “re-tratar a" vida real; se chega a estabelecer como parâmetro de qualidade o quão “fiel à vida real” se consegue ser... “Vida real”...o que que é isto? Nossas funções orgânicas, o que se processa entre os glúons, quarks e léptons? Como tudo isso se encadeia no conjunto total?

A discussão política, ou da “vida”, nossos temas “concretos”, às vezes servem de escapismo pra conta que tem de se pagar, pro perdão que se deixou de pedir, de dar...pros defeitos que apontamos nos outros para escapar dos nossos. Nossas manifestações humanitárias não servem de escapismo para os modos como agimos de forma rude com aquela pessoa?.. Nossos motes e jargões religiosos e antirreligiosos, ideológicos, nossas “compaixões”, não são escapismos das vergonhas que sentimos de muitas nossas ações, nossas frustrações, para as quais buscamos esses escapismos pra nos convencer que no fundo somos “pessoas boas” e nos darmos todas as licenças ao sabor de nossos caprichos?



Influenciado pelo mestre Paulo, o (s) discípulo (s) autor (es) emprega o estilo retórico dos filósofos de moral; costumavam explanar sobre os conflitos para se viver uma vida de virtude como uma competição esportiva ou uma guerra. As imagens: o preparo dos soldados e a formação das brigadas do exército romano. Cinturão: protegia o ventre. Couraça: protegia o peito. Capacete, obviamente a cabeça. Sandálias: proteção dos pés para poder marchar firme e compassado. Escudo: protegia contra os dardos.

Para a eficácia verdadeira, se formava um bloco fechado de soldados. A espada era empregada na luga frontal com o inimigo. Assim, a mensagem e o espírito do Evangelho é o que o cristão tem para manejar quando confrontado frente a frente com os poderes do caos, absurdo, exploração, crueldade... agindo sobre as pessoas e pelo sistema. Alude-se ao “Evangelium de César”, as “boas-novas” que eram proclamadas à frente da procissão pomposa que vinha do Imperador saudando uma conquista bélica de um território. Aqui, é o Evangelho da Paz, de Jesus Cristo, em desafio franco e aberto.

A oração de uns pelos outros... Um soldado só, é vulnerável. Ele abre a guarda do grupamento. O exército coeso não se conseguia deter. As portas do inferno não prevalecem sobre ele. Cada assessório mencionado, maneado em conjunto, cobria o pelotão e o permitia avançar. Os cristãos se unem e se cobrem orando uns pelos outros, porque não se deixa assim a união espiritual ante os ataques do cotidiano que pode fazer os momentos mais vívidos de fé íntima esvanecerem. Persistir.

Um dos meus maiores constrangimentos em orar costuma ser em não me achar bom o suficiente, vindo à tona que encontro em mim sentimentos de que o momento de oração logo se torna desagradável, vem a mim todas minhas motivações diversas que são harmoniosas com os valores e propagandas deste sistema que o Evangelho condena. Mas o escritor de Efésios pede que o próprio Espírito de Deus seja o Suscitador da oração. “Pois, embora a consciência nos acuse, Deus é maior que a nossa consciência e tudo conhece”. Não se manifestar em mim ainda aquilo a que Deus sonhou para mim, e ousar dobrar meus joelhos para Cristo, não é escapismo. E encontro. Destes encontros vêm a vitória de Deus contra o mal em mim, e no meu mundo. O mistério do Evangelho.

17 de agosto de 2012

Quem é o vencedor? Quem é o vencido? "Cristianismo" x Cristianismo

Certo dia, quando íamos para o lugar de oração, veio ao nosso encontro uma jovem escrava que tinha um “espírito de Píton”; ela dava para seus patrões muito lucro, emitindo oráculos. Começou a seguir-nos, a Paulo e a nós, clamando: 'estes homens são servos do Deus Altíssmo, vos anunciam um caminho de salvação'. Isto ela o fez por vários dias. Fatigado com aquilo, Paulo voltou-se para o espírito, dizendo: 'Em nome de Jesus Cristo, ordeno que te retires dela!' E na mesma hora o espírito saiu.
Vendo seus patrões desaparecer a esperança de seus lucros, agarraram Paulo e Silas e os arrastaram até a praça pública – a Ágora -, à presença dos magistrados. Apresentando-os aos estrategos, disseram: ' Estes homens estão perturbando nossa cidade; são judeus e anunciam costumes que não nos é lícito acolher nem praticar, nós que somos romanos”. Amotinando a multidão contra eles, os estrategos depois de mandarem arrancar-lhes as vestes, ordenaram que fossem espancados com varas. Depois de lhes infligirem muitos golpes, lançaram-nos à prisão, recomendando ao carcereiro que os vigiasse com cuidado.
Atos 16, 16-23




Tem ficado cada vez mais escancarado o quanto muitos manipulam a fé cristã, não se contentando em apenas tratá-a como simples mercadoria, mas como uma ferramenta de dominação psico-econômica. Pisa-se e ataca-se os sofrimentos, angústias, aspirações das pessoas, enquanto lhes transformam em nacos de uma massa de um bolo de estelionato. “Apóstolos” e congêneres arrogam ter um poder especial sobre forças espirituais que os atendem e podem produzir milagres em massa para solucionar os problemas, em troca requerem poder na engrenagem econômica de um sistema de lógica exploradora. Por outro lado, as pessoas se submetem a esquemas mesquinhos, justificam-lhes, caçam jargões para os justificar. Em nome de serem “bem-estabelecidas” no mesmo sistema. E o cristianismo é instrumentalizado pelas forças as quais nasceu se opondo.

Tomemos um episódio especial dos registros das origens cristãs que iluminam como a lógica essencial da fé cristã é diametralmente oposta a estes apelos estelionatários, como na verdade nasceu com um norte subversivo e julgado extremamente perigoso para o “caldo religioso” do sistema.

O cenário para essa narrativa é cuidadosamente preparado por Lucas para apresentar o contexto maior na aproximação e primeiros contatos com a fé cristã emergente e o sistema religioso do Império ( que seja mais apropriado focar o sistema religioso do Império, ao invés de ser as religiões em si, veremos adiante como se justifica).

Nessa narrativa, o escritor não nomeia a mulher, como o faz com as mulheres de suas narrativas habituais. Pois ela não fala por si mesma. Ela tinha um “espírito de Píton”, a serpente mitológica que nas tradições em torno do Oráculo de Delfos, fora derrotada pelo deus Apolo (conforme transmitido pelos escritores Ésquilo e Plutarco). Píton e todo o seu sistema cultual a controla para dar lucro aos seus senhores. Ela é um canal do mecanismo de acumulação deles, um instrumento e objeto de tal. E isto lhe roubara a identidade.

A tradição remontada ao Oráculo de Delfos o aponta como um centro religioso em que se buscava respostas e soluções práticas para as vicissitudes da vida com augúrios. Se contava com o bom agouro da profecia, palavras garantindo que tudo vai dar certo; cumprindo-se protocolos para agradar ao deus, esperava-se que fosse garantida mais estabilidade, previsibilidade e segurança para a existência. “Ora Apolo intervém sob a forma corporal do próprio deus, ora concede ao espírito de algumas criaturas humanas conhecer a sua própria vontade” (Plutarco, “Sobre o desaparecimento dos oráculos”, IX, 26). O oráculo interpretava a ordem do mundo e o sistema religioso ofertava uma relação em que a pessoa trabalhava em cima de supostos mecanismos de regência da “ordem” do mundo. E utilizava-o às suas conveniências.

A escrava “vende” o produto de seus patrões aos seus clientes, e aqueles ficam com os frutos. A questão monetária é mencionada cedo com sutil ênfase por Lucas. Primeiramente o mercadológico, enfatizando que a dimensão religiosa é eminentemente funcional para aquele.

A primeira vista pareceria que os missionários poderiam se servir deste sistema econômicorreligioso. Parece que ela estava sendo arauto deles. Mas não. Os proclamando como servidores do “Deus Altíssimo”, seria naquele ambiente como dizer que eram também alguém parte deste sistema, em nome de “Zeus-Hyposistos”, o Deus Altíssimo cultuado em diversos lugares, e seria uma evocação de uma fórmula mágica; soaria como “são dos nossos”. A ação deles que ela designa, como anunciando caminho de salvação, estaria embebida perfeitamente nas apresentações de iniciações de cultos esotéricos. Eles poderiam ter tirado proveito, de maneira utilitária, de um sistema bem firmado e sucedido.

Mas não; rejeitam a lógica. Peremptoriamente deslegitimam que sua missão se utilize desta forma de exploração religiosa. A divindade que anunciam não é inofensiva. O caminho até ela não é inofensivo para o sistema. Toleram por dias a repetição e dão a compreender que não chegam a priori com uma guerra aberta. Mas não dão corda. Não têm parte.

Paulo confrontara não a escrava, a parte mais frágil do elo, mas a própria força da cadeia de dominação. E sua espiritualidade se manifesta gratuitamente, diretamente em propiciar, primeiro como consequência, que a escrava seja ela mesma. E a “fraqueza” vencera a “força”. Não se conta que ela seguira os cristãos. Mas ela não era mais dominada, nem pelo sistema, nem pelos patrões. Teria sua liberdade interior. Mostraram o que para eles era seria “salvação”. O poder espiritual deles sobre ela não tinha mais eficácia. O sistema havia sido confrontado por uma contra-cultura.

E o que era “estes homens são servidores do Deus Altíssimo” na boca da “propriedade” dos patrões, passa a ser “ estes homens estão perturbando”; o que era “eles vos anunciam um caminho de salvação” passa a ser “anunciam costumes [ ethos – modo de ser e viver] que não são lícitos a nós”. Ameaçou-se seu “orgulho nacional”. Os senhores viram que findara a “esperança de seus lucros”. A vida da escrava não contava. Nem mesmo a divindade e a religião em si não era o centro. Eram apenas o que lhes propiciavam lucros.

E o grande sinal: apresentaram os missionários aos magistrados, acusando-lhes do ponto mais nevrálgico do que tinha se passado: desestabilizar a ordem. Poderiam ter frisado a questão econômica, dentro do que as leis versavam. A “Lei Aquileia” versava sobre danos à atividade econômica, pedindo contas à justiça; a “Lei das Doze Tábuas” falava do emprego de forças sobrenaturais para causar prejuízo à propriedade de alguém (o que um escravo era naquele regime). Mas vão além, ao mais básico, ao mais radical, ao mais profundo: a subversão. E o perigo do “proselitismo” era que isso pudesse contaminar a população e se espalhar. O status quo da organização econômica estaria em perigo. Não era apenas um caso de relações privadas, mas um fato político. As estruturas estavam em perigo. Este era o poder do nome de Cristo.

O que poderia ser uma exposição para alimentar um chauvinismo religioso aqui, muda de figura quando se convoca à reflexão: o “rosto” predominante da apresentação dos discursos dotados de símbolos cristãos hoje, na sociedade, incorporam que lado? As mega-igrejas e as instituições econômicas de cobertura religiosa cristã têm hoje tomado o papel do sistema aí representado envolvendo o Oráculo e o Espírito de Píton, com seus senhores, escravos, clientes querendo garantias contra os riscos da vida. E reproduzem o caráter social, a canalização de nossa energia e vontade para uma lógica dada, bem como o apelo simbólico fetichista, do nosso sistema econômico. As pessoas sacrificam sua integridade, sua auto-expressão, e os “manipuladores do discurso divino” se alimentam de suas carências e medos. Mudaram apenas os nomes dos símbolos, mas os códigos subjacentes permanecem. Irônica e tragicamente. E sempre a mesma prontidão contra os mesmos que ousarem fazer o que os missionários fizeram, deixando os “escravos” emancipados do controle de sua alma. Deve-se ter cuidado com estes.

Lembrando o poeta Horácio, “os vencidos conquistaram os vencedores” ?

1 de agosto de 2012

Acontece em Goiânia


25 de julho de 2012

Em honra de São Tiago, o Menor, Apóstolo de Jesus Cristo

Naqueles dias, alguns profetas desceram de Jerusalém a Antioquia. Apresentou-se um deles, chamado Ágabo, o qual começou a anunciar, por meio do Espírito, que estava pra vir uma grande fome sobre toda a terra. E ela de fato veio, no reinado de Cláudio. Decidiram então os discípulos, cada um segundo suas posses, enviar contribuições em ajuda aos irmãos que moravam na Judeia. Eles de fato o fizeram, enviando-as aos anciãos por intermédio de Barnabé e de Saulo. Nessa mesma ocasião o rei Herodes começou a tomar medidas visando a maltratar alguns membros da Igreja. Assim, mandou matar a espada Tiago, irmão de João. E, vendo que isto agradava aos judeus, mandou também prender Pedro. Era no dia dos Pães Sem Fermento.
Atos 11,27-12,3.


Vinte e cinco de Julho é no calendário litúrgico da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil data de celebração à honra e memória de São Tiago, o apóstolo. Ele fora um dos Doze dos círculo de discípulos de maior incumbência por parte de Jesus, simbolizando a restauração da nação israelita. Irmão do apóstolo João, filhos de Zebedeu, ganharam de Jesus o apelido de “Boanerges”, “Filhos do Trovão”.

Efetivamente no período relatado no trecho de Atos, houvera uma grande fome; o território da Judeia foi especialmente afetado. Vimos aí uma das primeiras características da continuidade do movimento idealizado por Jesus, quando pessoas de outras nações, povos, países, promovem coletas para ajudar os mais vulneráveis. E os líderes, os Anciãos/Presbíteros, cumprindo a função de servirem na organização dos suprimentos recebidos.

Chegamos à morte de Tiago; o Herodes mencionado ali, Antipas I, era o filho e cunhado de Herodes Magno, meio-irmão do Herodes Antipas, personagem importante nos evangelhos. Ele se unira ao partido do maníaco Gaio Calígula em Roma, se tornando quando da entronização deste como imperador, oficialmente “rei dos judeus” em cerca de 37 d.C. Era uma figura carismática muito influente na população, frequentava o Templo.

Nas mãos deste, o primeiro grande martírio cristão. Vemos aí uma figura recorrente na história e no período contemporâneo: uma liderança despótica com poder de sedução nas massas, que apela para e explora seus símbolos e elementos de aglutinação cultural (frequentemente religioso), e que assim se julga acima do bem e do mal. Insaciável.

Então, aproximou-se de Jesus a mãe dos filhos de Zebedeu com seus filhos e, prostrando-se, fez-lhe um pedido.
"O que você quer? ", perguntou ele. Ela respondeu: "Declara que no teu Reino estes meus dois filhos se assentarão um à tua direita e o outro à tua esquerda".
Disse-lhes Jesus: "Vocês não sabem o que estão pedindo. Podem vocês beber o cálice que eu vou beber? " "Podemos", responderam eles.
Jesus lhes disse: "Certamente vocês beberão do meu cálice; mas o assentar-se à minha direita ou à minha esquerda não cabe a mim conceder. Esses lugares pertencem àqueles para quem foram preparados por meu Pai".
Quando os outros dez ouviram isso, ficaram indignados com os dois irmãos.
Jesus os chamou e disse: "Vocês sabem que os governantes das nações as dominam, e as pessoas importantes exercem poder sobre elas.
Não será assim entre vocês. Pelo contrário, quem quiser tornar-se importante entre vocês deverá ser servo, e quem quiser ser o primeiro deverá ser escravo;
como o Filho do homem, que não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate por muitos".
 Mateus 20:20-28


No trecho do Evangelho segundo a tradição de São Mateus, vemos algo nada honroso por parte dos irmãos; na vergonha do que estavam fazendo, tentaram usar sua mãe para “amolecer” Jesus e fazê-lo considerar seus pedidos de lhes conferir o domínio ao seu lado. Possivelmente entenderam o “cálice” a que Jesus se referia como o símbolo de glória dos cálices dos reis; mas Jesus empregava um recurso de linguagem próprio dos profetas, como em Isaiás 51,17, que era cálice de um sofrimento que se recai. E ele antevera que recairia sobre eles também...

Adviera grande celeuma entre os discípulos; com razão, os outros dez se sentiram ultrajados com a atitude de Tiago e João. Jesus então agiu como Mestre, chamando a todos e subvertendo completamente suas noções de poder, o que tornaria a discussão vã. Redefine o poder como capacidade e possibilidade de servir. E a honradez como a disposição e préstimo em servir. Evoca mesmo a figura do Filho do Homem para si, que era uma lenda entre os judeus sobre alguém que viria julgar o mundo, fazer justiça aos fiéis de Deus e restabelecer a nação israelita. Observe sua raiz:

Eu continuava contemplando, em minhas visões noturnas, quando notei, vindo sobre as nuvens do céu, um como Filho do Homem. Ele adiantou-se até ao Ancião de Dias e foi introduzido em sua presença. A ele foi outorgado o poder, a honra e o reino, e todos os povos, nações e línguas o serviram.
Daniel 7,13-14

Jesus então empregou uma frase de forte altissonância para impactar seus seguidores, evertendo suas compreensões tradicionais. A lição ficara marcada no início de seu movimento, ficara marcada no apóstolo Tiago.


Oração para o dia de São Tiago, o Menor, Apóstolo de Jesus Cristo, no Livro de Oração Comum:
Senhor Deus, o teu apóstolo Tiago consentiu em deixar seu pai e tudo o que possuía e ainda em sofrer pelo nome do teu Filho; ajuda-nos misericordioso para que nenhuns laços terrenos nos afastem do teu serviço. Mediante Jesus Cristo, nosso Senhor. Amém.

11 de julho de 2012

Nem alforje, nem dinheiro ao cinto

E ele percorria os povoados circunvizinhos, ensinando. Chamou a si os Doze e começou a enviá-los dois a dois. E deu-lhes autoridade sobre os espíritos impuros. Recomendou-lhes que nada levassem para o caminho, a não ser um cajado apenas; nem pão, nem alforje, nem dinheiro ao cinto. Mas que andassem calçados com sandálias e não levassem duas túnicas. E dizia-lhes: “Onde quer que entreis numa casa, nela permanecei até vos retirardes do lugar. E se algum lugar não vos receber nem vos quiser ouvir ao partirdes de lá, sacudi o pó de debaixo dos vossos pés em testemunho contra eles”. Partindo, eles pregavam que todos se arrependessem. E expulsavam muitos demônios, e curavam muitos enfermos, ungindo-os com óleo.


Diferente de muitos líderes carismáticos e formadores de grupos religiosos, Jesus não parecia ter um ministério marcado por um apelo a se apartar da sociedade e da vida do povo; parecia se envolver e adentrar nas comunidades e relacionar sua mensagem com a vida delas.

O cenário retratado pelo evangelista Marcos acentua isto bastante. Ele situa essa passagem logo após narrar a rejeição do Mestre em sua região. Ainda assim, não sucumbe à tendência de dar, a partir disso, um direcionamento à sua proclamação para um sentido de apartamento do mundo social dos aldeões... antes ele permanece percorrendo e ministrando nos povoados, e a atribuição aos seus discípulos para fazer o mesmo, no mesmo caráter.

Os Doze. Jesus não selecionou doze discípulos priores à toa; sem dúvida passava o entendimento de remontar ao povo de Israel unido; ao Israel idealizado; remetiam às doze tribos das origens do povo de seu Deus. Mas a ênfase de Jesus não seria a nostalgia do passado; mas à perspectiva do futuro, à restauração do povo, restauração com a terra, restauração consigo mesmos, restauração com Deus.

E muito importante quando Marcos coloca que a estes Doze ele lhes outorgou poder. A questão passa a ser como ele lhes incumbira de exercer este poder...

Primeiramente, são chamados a associarem sua missão com a vida as comunidades, e não se apartarem num tipo de “esnobismo espiritual” delas. Também, são chamados a se despojarem e dependerem totalmente de Deus.

Não tinham reservas de sustento: não levavam suprimentos, não podiam usa a comum túnica sobre-capa, a qual era cusual como cobertor, colcha de cama, na falta de pousada para a noite. Apenas uma túnca. Tinham que contar que Deus iria providenciar. Não poderiam mendigar, não usando as bolsas que os mendigos usavam. Aceitar o pouso que lhes oferecessem, a comida que lhes dessem, sem ter a opção de migrarem para as casas mais confortáveis nos povoados caso lhes oferecessem no decorrer da estadia. E em caso de rejeição, deixarem a causa por conta de Deus, para ele acertar as contas com as pessoas, não levando consigo a mágoa e rancor...sacudir a poeira e deixar as pessoas com suas responsabilidades.

Marcos, diferente de Mateus 10.9, diz que os discípulos poderiam usar um bordão. Talvez porque a combinação deste com as sandálias remetesse à imagem do êxodo do Egito – Ex. 12.11 – ou porque Mateus os quis diferenciar de outros grupos de pregadores itinerantes.

Marcos chama a nossa atenção para a associação entre a mensagem de arrependimento com a expulsão dos demônios e cura. É como se quisesse mostrar que para o caráter da missão de Jesus, estavam mesmo interligados. O arrependimento, a restauração, a derrota do mal e o sanar. Realmente, causamos muitos males a nós mesmos, de cunho psicológico e físico, com nossas culpas que carregamos; também com as ações más, que reverte-se em nós, ou que deformam nossa imagem e semelhança de Deus. Quebramos nossas resistências e tendemos a entrar numa espiral viciosa de degradação interior ou exterior, que não se retrai; apenas pode ser quebrada; este é o papel da confissão e do arrependimento.

Marcos continua nos conduzindo a esta apresentação do comissionamento de Cristo. Nos transporta a seguir para um cenário contrastante, com o fausto e perversão da corte herodiana, e dela para a morte de João Batista, como que indicar realmente que este discipulado tem um preço, e que não é algo, digamos, “romântico”, mas um embate mortífero com as forças contrárias...

13 de junho de 2012

Religião por Direitos - Cúpula dos Povos

As agências e organizações ecumênicas estarão realizando grande parte suas atividades no espaço de Religião Por Direitos. Visitem o site www.pad.org.br e/ou o blog www.religioespordireitos.blogspot.com onde consta a programação.

8 de junho de 2012

[A Rocha Brasil] Dia 16/junho: Mutirão de Oração por um Mundo Justo e Sustentável

Dia 16 de junho (sábado) o coletivo Igrejas Ecocidadãs realizará um Mutirão de Oração por um Mundo Justo e Sustentável.


Estarão lá no Rio de Janeiro, participando do 2° dia da Cúpula dos Povos na Rio+20 e orando por TODA a CRIAÇÃO.

Convidam a todos a separarem também um tempo especial no dia 16 para se juntarem em oração. Organize uma reunião de oração em sua igreja, junte a família e amigos.

Participe como puder, ore sozinho se não tiver opção, mas separe um tempo e ore.

Interceda junto a Deus pelos pobres, que são na sociedade os mais vulneráveis e diretamente afetados pelos agravos causados ao meio ambiente; peça perdão pelo silêncio da Igreja diante de tanta injustiça social e ambiental; peça que Ele se manifeste na Cúpula dos Povos e na Rio+20; e agradeça por TODA a Sua CRIAÇÃO.

Para incentivá-los, elaboramos um vídeo e criamos uma sugestão de liturgia (clique AQUI para baixar o PDF).

Participe, compartilhe, divulgue.

Graça e Paz.

PorRaquel Arouca e Caio Marçal


--
Raquel Arouca
Bióloga - Dra. Ciências
Executiva A Rocha Brasil

3 de junho de 2012

Crepúsculo no Cerrado

Os céus proclamam a glória de Deus; o firmamento proclama a obra das suas mãos.
Um dia fala disso a outro dia; uma noite o revela a outra noite.
Salmos 19:1-2



6 de maio de 2012

Uma nova identidade







Estamos sempre acercados pela indagação quanto a nossa identidade. O que nos distingue? Quem somos e por que somos? Isto está arraigado em questões de valor próprio, de nos apercebemos que temos uma singularidade, ou fazemos parte de algo maior mas também específico, e não somos apenas algo amorfo em uma massa de bolo.
 

O livro bíblico de Deuteronômio foi produzido em períodos de crise, após a divisão de Israel no Reino do Norte e em Judá, no sul. Possui uma base composta primeiramente no Reino do Norte, numa crise diante da perspectiva de ter sua cultura absorvida, tendo perdido o centro simbólico cultural, Jerusalém, com a divisão territorial, perigo de absorção cultural e religiosa com povos vizinhos com os quais se promoviam alianças políticas e intercâmbios econômicos...se reliam as tradições mais antigas sobre as origens de Israel com o Êxodo do Egito e a passagem pelo deserto, com novas molduras e traços, sob esta perspectiva; mais tarde foi acrescentado e remoldurado mais, tendo chegado até o Reino do Sul, e mais ainda sob o reinado do Rei Josias, após uma profunda reforma no sistema religioso do Templo, quando este Reino também passava por uma grave crise religiosa e de liderança.

Percebemos então estas formas, marcas e acentos em passagens emblemáticas como:
Agora, pois, pergunta aos tempos passados, que te precederam desde o dia em que Deus criou o homem sobre a terra, desde uma extremidade do céu até à outra, se sucedeu jamais coisa tão grande como esta, ou se jamais se ouviu coisa como esta?

Ou se algum povo ouviu a voz de Deus falando do meio do fogo, como tu a ouviste, e ficou vivo?
Ou se Deus intentou ir tomar para si um povo do meio de outro povo com provas, com sinais, e com milagres, e com peleja, e com mão forte, e com braço estendido, e com grandes espantos, conforme a tudo quanto o SENHOR vosso Deus vos fez no Egito aos vossos olhos?
A ti te foi mostrado para que soubesses que o SENHOR é Deus; nenhum outro há senão ele.
Desde os céus te fez ouvir a sua voz, para te ensinar, e sobre a terra te mostrou o seu grande fogo, e ouviste as suas palavras do meio do fogo.
E, porquanto amou teus pais, e escolheu a sua descendência depois deles, te tirou do Egito diante de si, com a sua grande força.
Para lançar fora de diante de ti nações maiores e mais poderosas do que tu, para te introduzir e te dar a sua terra por herança, como neste dia se vê.
Por isso hoje saberás, e refletirás no teu coração, que só o SENHOR é Deus, em cima no céu e em baixo na terra; nenhum outro há.
E guardarás os seus estatutos e os seus mandamentos, que te ordeno hoje para que te vá bem a ti, e a teus filhos depois de ti, e para que prolongues os dias na terra que o SENHOR teu Deus te dá para todo o sempre.
Deuteronômio 4:32-40


Ali, repensar seu lugar na História do Mundo vista a partir da vontade de Deus, a honra e a responsabilidade como tal, e o reforço a se notarem que têm marcas especiais em si e não podiam diluir isto.


Na Primeira Carta de João, temos uma comunidade com grandes problemas. O caldo cultural greco-romano tinha uma predominância acentuada de se considerar a verdadeira identidade da pessoa numa substância delineada imaterial e independente, com imortalidade inata, presa no corpo. Assim, tinha dificuldade com as heranças judaicas do cristianismo, que enfatizavam a participação da matéria e do corpo no horizonte para além da história do plano de Deus, e também na obra redentora de Jesus. Era difícil aceitar que a redenção do mundo por Jesus se deu com a participação central do seu corpo; isto deveria ser uma ilusão para os menos esclarecidos. Necessidades próprias de renovação e de redefinirem-se em seu tempo também fazia com que desdenhassem da autoridade do Ancião João. Assim, ele enfatiza a ética coerente no presente tempo, como forma de ver que tendo ela inevitavelmente que se praticar no mundo material e com o corpo, não faz sentido desvincular Cristo de sua participação material e corpórea em sua obra redentora. E que o vínculo entre si e com Cristo seria nesta participação também, retroagindo pelo agir coerente com seus mandamentos, implicando daí na observância do amor como padrão maior e enxergando como isso vincularia as gerações da igreja e como isto respaldaria sua aliança.

Meus filhinhos, não amemos de palavra, nem de língua, mas por obra e em verdade.
E nisto conhecemos que somos da verdade, e diante dele asseguraremos nossos corações;
Sabendo que, se o nosso coração nos condena, maior é Deus do que o nosso coração, e conhece todas as coisas.
 Amados, se o nosso coração não nos condena, temos confiança para com Deus;
E qualquer coisa que lhe pedirmos, dele a receberemos, porque guardamos os seus mandamentos, e fazemos o que é agradável à sua vista.
E o seu mandamento é este: que creiamos no nome de seu Filho Jesus Cristo, e nos amemos uns aos outros, segundo o seu mandamento.
E aquele que guarda os seus mandamentos nele está, e ele nele. E nisto conhecemos que ele está em nós, pelo Espírito que nos tem dado. 
I João 3, 18-24



O Evangelho de João tem grande probabilidade de advir dos testemunhos do mesmo João das cartas. Mas não há como se ter toda a certeza. Escrito em torno de 60 anos após a Ressurreição de Jesus, de qualquer forma, visualiza-se entre os estudos especializados que era também um ambiente em crise. Eu visualizo uma comunidade plural, com muita gente oriunda de meios diversos do judaísmo, oriundas do núcleo dele a partir do epicentro em Jerusalém e raios mais místicos de tal; samaritanos, isto, um ambiente que acolhera samaritanos; gentios. Havia diversos traumas de separação: a drástica separação da sinagoga, a partir de 70 d.C. após a assolação de Jerusalém e destruição do Templo; samaritanos que enfrentavam a rejeição de judeus e poderiam ser – e julgo, eram mesmo- questionados por judeus-cristãos de diversas partes, a própria igreja sendo questionada quanto a legitimidade de ter havido uma missão entre eles; gentios, ou seja, não-judeus (pela ótica dos judeus), estigmatizados no mundo romano. Provavelmente enfrentavam também oposição e questionamento de círculos que buscavam continuar a tradição de João Batista.

Neste Evangelho, se mostra como a nova identidade em Cristo redefinia tudo; a participação no amor dele, e o novo ambiente de vida e estar no mundo a partir do seguimento a ele, e o vínculo que se dava a partir de estarem ligados a Jesus e ao Pai pelo Advogado/Consolador, o Paracleto, o Espírito, era agora o autorreferencial, de cada um e de todos. Não mais deviam ter como parâmetro a mentalidade predominante na sociedade com aquilo que estabelecia como padrão para o valor pessoal e para se ter status; mais do que qualquer vínculo, este vínculo espiritual era agora uma porta de entrada a um novo mundo, da vida eterna com Deus.
Podemos entender

Se me amais, guardai os meus mandamentos.
E eu rogarei ao Pai, e ele vos dará outro Consolador, para que fique convosco para sempre;
O Espírito de verdade, que o mundo não pode receber, porque não o vê nem o conhece; mas vós o conheceis, porque habita convosco, e estará em vós.
Não vos deixarei órfãos; voltarei para vós.
Ainda um pouco, e o mundo não me verá mais, mas vós me vereis; porque eu vivo, e vós vivereis.
Naquele dia conhecereis que estou em meu Pai, e vós em mim, e eu em vós.
Aquele que tem os meus mandamentos e os guarda esse é o que me ama; e aquele que me ama será amado de meu Pai, e eu o amarei, e me manifestarei a ele.

João 14:15-21



E ver como foi impactante para o eunuco etíope, em Atos 8, 26-40, ao mesmo tempo advindo de traumas de desprezo por ser de um povo então há séculos desterrado e espalhado por nações, estigmatizado por muitos como feitos para serem serviçais, e ele um eunuco; mas também, ser alguém de uma posição singularmente importante na hierarquia para com sua rainha, um administrador, oficial encarregado de seus tesouros, mas também alguém privado de poder deixar descendência. Impactante para o eunuco etíope, no primeiro registro de uma conversão gentia no cristianismo, ter redefinida sua história e identidade a partir da identificação da mensagem de Jesus, Redentor, como Servo Sofredor, de Isaías 53; sua identificação em participar de Jesus e se referenciar a partir dele agora. Ele vê chegando a si a expectativa da profecia de Isaías, 56, 4-5.

19 de abril de 2012

Contra o narcicismo

(...)
Oh, nós que sequer podíamos exalar
         Um tíbio suspiro quando ouvimos 
Pulsar a cupidez em nosso próximo e o fogo no vizinho
Mas aninhados e gemebundos na parede azul do céu
Vertemos agora uma lágrima imensa pela queda quase ignorada,

                   Pelo declínio dos lares,
                   Que não amamentam nossos ossos,
                   Nossa genuína poeira de estrangeiros
          Nem as mortes indômitas de uns poucos a quem jamais encontramos,
          Cavalgar através das portas de nossa casa inviolada,
                    Vemos agora, solitários em nós,
Exilados em nós mesmos, despertarmos o tenro,
Desenfreado, indefeso, sedoso e áspero amor que despedaça todas as rochas.

Em "Houve um Salvador". Do livro Mortes e entradas - Dylan Thomas.

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Pintura: Fin de Trayecto - Juan Genovés  

15 de abril de 2012

Aproxima a tua mão e coloca-a ao meu lado

Todavia, Tomé, um dos Doze, aquele a quem chamavam Dídimo [Gêmeo], não estava entre eles quando Jesus veio. Os outros discípulos lhe disseram: _ Nós vimos o Senhor!

Mas ele lhes respondeu: _Se eu não vir em suas mãos a marca dos cravos, se eu não enfiar o meu dedo no lugar dos cravos e enfiar a minha mão no seu lado, não acreditarei!

Ora, oito dias mais tarde, os discípulos estavam de novo reunidos na casa, e Tomé estava com eles. Jesus veio, com todas as portas trancadas, pôs-se no meio deles e disse: _ A paz esteja convosco! Em seguida, disse a Tomé: _ Aproxima o dedo aqui e olha as minhas mãos; aproxima a tua mão e coloca-a ao meu lado, deixa de ser incrédulo e torna-te um homem de fé.

Tomé lhe respondeu: _ Meu Senhor e meu Deus!


Tomé aparece antes no evangelho como intrépido, sincero e honesto ainda que se venha a vulto uma figura de desconfiada ao pessimismo. Vejamos João 11,16: Então, Tomé, aquele que se chama Dídimo, disse aos outros discípulos: “Vamos, também nós, e morramos com ele”. 14,5: Tomé lhe disse: “Senhor, nós nem sabemos para onde vais, como poderíamos saber o caminho?”

Não devemos subestimar a fidelidade dele ou, poderia divagar, a ânsia e anelo de fé, como se costuma vulgarmente se fazer. A questão aí não era meramente de crença ou assentimento intelectual com a possibilidade de ressurreição de Jesus, no abstrato. Antes era algo envolvendo também o emocional, o existencial.

Essa dedicação e prontidão em ir até o fim com Jesus tivera um grande desapontamento e frustração com os acontecimentos da Paixão e Crucifixão. Devemos lembrar que Jesus fora humilhado pelos líderes sacerdotais e pelos representantes romanos. Não prorrompera no ínterim nenhuma manifestação do irromper do Dia do Senhor. A exaustão moral e da alma da pessoa chegara ao extremo.

Para tomar parte com os demais discípulos na alegria da ressurreição, para Tomé tudo isto deveria ser derrotado primeiro. Saber de uma experiência visionária não o compensaria. A história de seu povo é marcada, espiritualmente, por muitas manifestações de visionários, com promessas e oráculos; e encontrava-se na situação de opressão e desalento naquele contexto.



Os discípulos ainda se encontravam pasmos com o turbilhão de acontecimentos desses dias. Estavam no findar da Festa dos Pães Asmos, e assim, pairava uma tensão no ar; os líderes podiam estar esperando alguma retaliação diante do ocorrido com Jesus; podia haver emboscadas, ou pontos de tensão com a multidão. Assim, é coerente esperarmos que ainda não tivessem partido para a Galiléia, embora pudessem já estar se aprontando para tal.

Ele teria que ver e experimentar da vitória de Jesus, atestando a vitória e vindicação por Deus nele. Para crer, teria que ter um encontro com aquele, aquele Jesus que ele seguiu e que sofreu; assim, em lugar de sua frustração, o ímpeto de sua fidelidade também ressuscitaria.

E desta vez, sem a nuvem soturna de pessimismo. Pois Tomé compreendeu e expressou que ali, tivera uma experiência de encontro total com o divino.



Michael Kiwanuka - "I'm Getting Ready"




Estou Me Preparando

Oh meu Deus, eu não sei o que significa crer
Oh meu Deus, eu não sei o que significa crer

Mas se eu segurar firme, é verdadeiro?
Será que você cuida de tudo o que eu faço?
Oh Senhor, eu estou me preparando para crer.

Oh meu Deus, eu não sabia quão difícil seria
Oh meu Deus, eu não sabia quão difícil seria

Mas se eu segurar firme, é verdadeiro?
Será que você cuida de tudo o que eu faço?
Oh Senhor, eu estou me preparando para crer.

Então acenaremos as mãos cantando livremente
Cantando em pé, agora está ficando fácil
Oh não olhe mais para baixo querido
Você não pode ver?

Oh Senhor, eu estou me preparando para crer

Então acenaremos as mãos cantando livremente
Cantando em pé, agora está ficando fácil
Oh não olhe mais para baixo querido
Você não pode me ver?

Oh Senhor, eu estou me preparando
Oh Senhor, eu estou me preparando
Oh Senhor, eu estou me preparando para crer

1 de abril de 2012

Tire seus sapatos

Guardai-vos dos falsos profetas, que vêm a vós disfarçados em ovelhas, mas interiormente são lobos devoradores. Pelos seus frutos os conhecereis. Colhem-se, porventura, uvas dos espinheiros, ou figos dos abrolhos? Assim, toda árvore boa produz bons frutos; porém a árvore má produz frutos maus. Uma árvore boa não pode dar maus frutos; nem uma árvore má dar frutos bons. Toda árvore que não produz bom fruto é cortada e lançada no fogo. Portanto, pelos seus frutos os conhecereis. Nem todo aquele que me diz: "Senhor,Senhor", entrará no Reino dos Céus, mas sim aquele que pratica a vontade de meu Pai que está nos céus. Muitos me dirão naquele dia: "Senhor, Senhor, não foi em teu nome que profetizamos e em teu nome que expulsamos demônios e em teu nome que fizemos muitos milagres?" Então eu lhes declararei: "Nunca vos conheci. Apartai-vos de mim, vós que praticais a iniquidade!"
Evangelho Segundo a tradição de São Mateus, 7.15-23



Eu sangro o sangue de Jesus sobre você
Eu sangro o sangue de Jesus sobre você
E sobre toda a merda das coisas que você faz
Sete vezes eu sangro o sangue de Jesus sobre você

Tire os sapatos - Você está em solo sagrado
Tire os sapatos - Você está em solo sagrado
Mesmo que você não possa mentir quando estou por perto
Tire os sapatos - Você está em solo sagrado

Eis que, na última lamparina
No final de sua rua
Eu estou sussurrando algo
"Venha para perto de mim, venha para perto de mim."
Eu digo que você está fugindo de agressão
Você está correndo para fora da agressão
E eu não vejo nenhum coelho
Por aqui
Se você creu em tudo que está em seu breviário
Se você creu mesmo em apenas um fantasma de mim
Você não estaria agora tão surpreso a me ver
Na vaidade com que tomou o meu nome

Você me trouxe a infâmia
E agora você está tão surpreso em me ver
E agora você está tão surpreso em me ver
Eis que, na última lamparina
No final de sua rua
Eu estou sussurrando algo
"Venha para perto de mim,
Venha para perto de mim."
Eu digo que você está fugindo de agressão
Você está correndo para fora da agressão
E eu não vejo nenhum coelho
Por aqui

Tire os sapatos - Você está em solo sagrado
Tire os sapatos - Você está em solo sagrado
Mesmo que você não possa mentir quando estou por perto
Tire os sapatos - Você está em solo sagrado
Tire os sapatos - Você está em solo sagrado
Tire os sapatos - Você está em solo sagrado
Mesmo que você não possa mentir quando estou por perto
Tire os sapatos - Você está em solo sagrado




Pois os tais são falsos apóstolos, obreiros fraudulentos, disfarçando-se em apóstolos de Cristo. E não é de admirar, porquanto o próprio Satanás se disfarça em anjo de luz. Não é muito, pois, que também os seus ministros se disfarcem em ministros da justiça; o fim dos quais será conforme as suas obras.
2 Coríntios 11:13-15



O Ladrão só vem para roubar, matar e destruir.
Eu vim para que tenham vida em abundância.
Eu sou o Bom Pastor,
o bom pastor dá a sua vida pelas suas ovelhas.
O Mercenário, que não é pastor,
a quem não pertencem as ovelhas,
vê o lobo aproximar-se
abandona as ovelhas e foge,
e o lobo as arrebata e dispersa,
porque é Mercenário
e não se importa com as ovelhas

Evangelho Segundo a tradição de São João 10,10-13

27 de março de 2012

Cúpula dos Povos por Justiça Social e Ambiental


A Plataforma Brasileira de Direitos Humanos Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais - Dhesca Brasil - se inseriu no processo da Cúpula dos Povos da Rio+20 por Justiça Social e Ambiental, paralelo à Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (UNCSD) – Rio + 20 , participando do Comitê Facilitador da Sociedade Civil para a Rio + 20.

O processo de Cúpula, que acontecerá entre os dias 15 e 23 de junho no Aterro do Flamengo, não intenta realizar atividades de organizações singulares, mas busca processos de articulação de diferentes organizações e movimentos, que possam convergir dentro dos grandes eixos propostos.

Na semana passada (18 a 20) houvera uma reunião no Rio de Janeiro com as redes internacionais, para internacionalizar o processo, fechar conjuntamente os eixos da Cúpula e a metodologia do evento. A proposta medotológica ainda está sendo fechada no Grupo de Trabalho Metodologia, já havendo informes preliminares de algumas propostas:

Os três grandes eixos da Cúpula vão também embasar as três grandes Assembleias dos povos que acontecerão 1) a denúncia das causas estruturais da atual crise e das novas formas de reprodução do capital; 2) as soluções e novos paradigmas dos povos; 3) as agendas, campanhas e mobilizações que articulam os processos da luta anticapitalista após a Rio +20.

Antes das Assembleias, porém, acontecerão Plenárias Pré-Assembleias, a fim de facilitar a convergência das atividades autogestionadas desenvolvidas durante a Cúpula. Os temas das Plenárias ainda estão em discussão no Grupo de Trabalho de metodologia, mas os indicados giram em torno dos eixos Trabalho, Consumo, Produção e Educação, sendo as Plenárias assim distribuídas:


1) Direitos, por Justiça Social e Ambiental;
2) Defesa dos bens Comuns, Contra a Mercantilização;
3) Soberania Alimentar;
4) Energia e Industrias Extrativas e
5) Trabalho: Por uma Outra Economia e Novos Paradigmas de Sociedade.

As datas das Assembleias dos Povos são:

  • 19 de junho - Assembleia sobre causas estruturais e falsas soluções
  • 21 de junho - Assembleia Nossas soluções
  • 22 de junho - Assembleia para agendas de lutas e campanhas

A proposta é que ao mesmo tempo em que as Assembleias estejam acontecendo, sejam organizadas também em outros países paralelamente manifestações, marchas, ações. A forma de integração (estratégias de comunicação) entre tais eventos ainda está sendo avaliada. Além disso, o dia 20 de junho foi eleito como dia de Mobilização Global, no qual estarão acontecendo em diversos países manifestações com denúncias das violações decorrentes do modelo de desenvolvimento, contra a economia verde e apontando alternativas da sociedade civil.

No espaço da Cúpula, além das atividades autogestionadas, das Plenárias e das Assembleias, acontecerão mobilizações, acampamentos e o chamado Pró-território do futuro, para que a Cúpula seja uma expressão das práticas que esperamos prevalecerem no futuro e as quais queremos construir. Ou seja, o espaço contará, por exemplo, com feiras e stands sobre economia solidaria, reciclagem de lixo etc. As inscrições para atividades autogestionadas acontecerão durante o mês de abril, e devem ser feitas pelo site http://www.cupuladospovos.org.br/







12 de março de 2012

Paraíso

Por Richard Bauckham

Em outro de meus ensaios, escrevi sobre o declínio da crença na vida após a morte na sociedade ocidental contemporânea, e sugeri algumas razões para isso. Então, eu não dei muita atenção à questão: o que é que os cristãos esperam para depois da morte?

Para pensar sobre o Paraíso precisamos de quadros imaginativos. Não podemos esperar saber em termos literais o que o céu vai ser. As tentativas de descrevê-lo, literalmente, são geralmente banais, e facilmente provocam a resposta: por que eu deveria querer isso? Quem quer passar a eternidade sentado numa nuvem tocando harpa? O paraíso deve ser inconcebivelmente diferente da nossa experiência aqui e agora. Então precisamos de imagens que evocam uma sensação de algo que transcende em muito nesta vida.

A Bíblia e a tradição cristã nos oferecem três imagens principais acerca do Céu. Se colocarmos esses três símbolos juntos, teremos uma idéia muito boa do que é a compreensão cristã do destino humano.

O primeiro é a esperança da visão de Deus. "Bem-aventurados os puros de coração", disse Jesus, "porque eles verão a Deus”. Deus, a quem agora conhecemos tão imperfeitamente, iremos então experimentá-lO diretamente. Vamos desfrutá-lO como o cumprimento final de todos os desejos humanos. Vamos adorá-lo com o tipo de atenção arrebatadora que uma experiência poderosa de beleza ou amor pode evocar em nós nesta vida. Porque Deus é infinito e nós fomos feitos para usufruí-lO, as alegrias do Céu nunca serão esgotadas. Vamos encontrar satisfação eterna em Deus.

Mas o Paraíso não será só eu e Deus. Deus nos fez para encontrar satisfação no outro, bem como nele. Assim, a segunda imagem do Céu é a cidade de Deus, uma sociedade humana perfeita, em que todos os nossos sonhos de relações humanas realmente adequadas serão cumpridas.

Mas o Paraíso não será só eu e Deus. Deus nos fez para encontrar satisfação no outro, bem como nele. Assim, a segunda imagem do Céu é a cidade de Deus, uma sociedade humana perfeita, em que todos os nossos sonhos de relações humanas realmente adequadas serão cumpridas.

Mas os propósitos de Deus vão além até mesmo de uma sociedade humana encontrando sua verdadeira realização em Si. Eles se estendem a toda criação de Deus. Nossa terceira imagem do Paraíso, o reino de Deus, é a mais ampla. Ela olha para o momento em que o governo de Deus sobre toda a sua criação finalmente será aperfeiçoado. Todo o sofrimento, o mal e a morte serão superados. O mundo de Deus será como ele sempre pretendeu que fosse. E quando todos os males e imperfeições que obscurecem Deus no mundo como é agora forem superadas, em seguida toda a criação irá perfeitamente refletir a glória de Deus. Como o apóstolo Paulo disse, "Deus será tudo em todos".

Assim, a esperança cristã é que o todo da criação de Deus encontrará o seu destino eterno em Deus. Embora, até agora , eu tenha usado o termo "Céu" para me referir à esperança cristã de vida após a morte, porque isso geralmente é feito, agora podemos ver que este termo pode ser um pouco enganador. Isso pode sugerir que o nosso destino é deixar o mundo para trás e se juntar a Deus em algum Céu puramente espiritual. A esperança cristã é muito melhor do que isso. É a união do Céu e da Terra, pela presença transformadora de Deus ao longo de sua criação.

Tudo isso deve alargar os nossos horizontes para além dos termos estritamente individuais em que tantas vezes se pensa o Paraíso. Nossa esperança, como indivíduos, é compartilhar do grande triunfo de Deus sobre todo o mal e a morte, para ter um lugar no seu propósito cósmico para toda a criação, para encontrar a nossa própria realização em Deus, no contexto de um mundo centrado em Deus e transfigurado pela Sua glória. Mas, sendo por é isso que o Céu diz respeito a todos, é claro , não podemos esperar para compartilhar afinal o que o

destino nos coloca agora, como indivíduos, dentro propósito de Deus para o Seu mundo. Para desfrutar da visão de Deus, então, devemos começar a centrar nossas vidas em Deus agora. Para entrar na cidade de Deus, então, devemos procurar a Sua vontade para a sociedade humana agora. Para entrar no reino de Deus, então, devemos colocar-nos sob o domínio de Deus agora e buscar o Seu reino em toda a realidade.