31 de dezembro de 2009

Maria, Simeão ou Ana? Quem primeiro reconheceu Jesus como Messias?

traduzido de artigo publicado em Biblical Archaeology Review

por Ben Witherington III

Ser o primeiro a saber nem sempre significa ser o primeiro a compreender. Na narrativa de nascimento de Lucas, Maria é a primeira a ser informada de que Jesus será o Messias. Lucas acrescenta que ela "entesourava as palavras" que o anjo Gabriel fala para ela. Mas Maria também está intrigada com a mensagem divina; está "perplexa" quando o anjo a saúda e precisa "ponderar" o significado de suas palavras (Lucas 1.29, ver também 2:19). Nisto, Maria contrasta com Simeão e Ana, dois idosos que acontece de estarem no Templo, quando José e Maria trazem o menino Jesus a Jerusalém pela primeira vez.

Segundo Lucas 2.22-24: "[José e Maria] levaram-no a Jerusalém para o apresentarem ao Senhor (conforme está escrito na lei do Senhor: 'Todo macho primogênito será designado consagrado ao Senhor'[citando o Êxodo 13.2,12]) e ofereceram um sacrifício de acordo com o que está previsto na lei do Senhor, 'um par de rolas ou dois pombinhos' [com base em Levítico 12.2-8]".

No Templo, a família é abordada por um homem chamado Simeão, a quem tem sido dito pelo Espírito Santo que não vai morrer até que ele tenha visto o Messias. (O mesmo Espírito disse-lhe para ir ao Templo naquele dia, também.) Simeão toma Jesus nos braços e louva a Deus: "Mestre, agora você está adespedir em paz o teu servo, segundo a tua palavra, porque meus olhos viram a sua salvação, que preparaste na presença de todos os povos, luz para revelação aos gentios, e para glória para o teu povo Israel"(Lc 2.28-32). Tendo visto o Messias, Simeão está agora preparado para morrer.

Ana, então, aproxima-se da Sagrada Família. Ela também reconhece Jesus como Messias, mas ela tem uma reação muito diferente: "Naquele momento, ela veio e começou a falar sobre a criança para todos os que esperavam a redenção de Jerusalém" (Lucas 2.38). Ela tem 84 anos, segundo Lucas, e ela não quer morrer: Ela quer fazer proselitismo. Tal como os discípulos que irão segui-la, ela é orientada para testemunhar o que viu. Maria foi a primeira a ter a boa notícia anunciada para ela, mas Ana é a primeira mulher a compreender plenamente e proclamar a boa notícia.

Isso ocorre porque, além de ser uma pregadora, Anna é uma “profetisa" (Lucas 2.36). Na verdade, ela é a única mulher no Novo Testamento explicitamente descrita como uma “profetisa". Ela, então está na linha de figuras como a juiza, chefe militar e profetisa Débora e a profetisa de Jerusalém Huldá, que, nos dias do Rei Josias, foi solicitada a verificar se um rolo antigo (uma forma de Deuteronômio) descoberto durante a reforma do Templo era realmente a palavra de Deus (2 Reis 22).

Ao contrário de Simeão, Ana não só está na visita ao Templo para o dia; ela está ali o tempo todo. Segundo Lucas, Ana "nunca deixava o Templo, mas adorava lá com jejum e oração, noite e dia" (Lucas 2.37). Talvez ela fazia parte de algum tipo de ordem de viúvas (Lucas nos diz que seu marido morreu depois de apenas sete anos de casamento) que tinham funções religiosas específicas no Templo. Ela pode ter sido capaz de assumir esse papel no Templo, porque ela já não estava em periódicos estados de impureza ritual causados pela menstruação.

Lucas também pode ter visto Ana como a segunda testemunha no ou em torno do Templo necessária para validar o significado de Jesus. Deuteronômio 19.15 salienta a importância de ter duas testemunhas para validar um evento.

O emparelhamento de Simeão e Ana reflete a propensão de Lucas para o paralelismo macho-fêmea quando ele escreve sobre os destinatários da bênção divina e da salvação. A história do nascimento de Jesus é emoldurada por duas histórias assim - de Isabel e Zacarias, em Lucas 1 e Ana e Simeão, em Lucas 2. Curiosamente, em ambas, a mulher é retratada como o exemplo mais positivo do discipulado. As mulheres não só estão mais receptivas à mensagem, elas estão mais dispostos a agir sobre ela, com Elizabeth percebendo que seu primo está carregando o Messias e louvando a Deus por essa bênção e Ana espalhando a boa notícia.

Alfred Plummer, em seu comentário clássico sobre Lucas, sugeriu que a diferença entre Ana e Simeão fornece uma pista para Lucas como um historiador da salvação, um cronista dos atos poderosos de Deus para o seu povo através dos tempos. Sim, um messias chegou, como Simeão reconhece, mas, como a profetisa Ana sugere, uma nova era, com uma nova e viva voz da profecia, tem ao mesmo tempo raiado.[1] Nesta nova era, a voz viva de Deus vai continuar a falar sobre o messiânico. Ana é a primeira de uma linha de discípulos proféticos que irão falar sobre Jesus a todos os que esperavam a redenção de Israel.

Nem todo mundo pode ser um profeta, no entanto. Maria, por exemplo, não entende completamente o que Ana imediatamente reconhece. E ela não o irá por vários anos.

Doze anos após a apresentação de Jesus no Templo, a Sagrada Família retorna a Jerusalém e Jesus retorna ao Templo, desta vez sozinho. Maria e José procuram por ele freneticamente por três dias. Quando finalmente encontram-no ouvindo e fazendo perguntas aos professores no Templo, Maria pergunta: "Filho, por que fizeste assim conosco? Olha, seu pai e eu fomos procurá-lo em grande ansiedade." Jesus responde:" Não sabíeis que eu devia estar na casa de meu Pai?" Porém, relata Lucas, "eles não entenderam o que ele disse a eles... [mas] a sua mãe guardava todas estas coisas no seu coração" (Lc 2.48-51). O falecido estudioso do Novo Testamento Raymond Brown escreveu: "A idéia de Lucas é que a aceitação completa da palavra de Deus, o entendimento completo de quem é Jesus, e o discipulado completo não é ainda possível. Este objetivo será concretizado através do ministério de Jesus e, em particular, através da cruz e ressurreição."

Claramente, Lucas não está pintando um retrato idealizado da Maria ou José. Ao contrário, ele pinta um quadro muito humano e realista de Maria e José como bons pais, ansiosos, preocupados, se esforçando para serem obedientes e compreender, mas ainda não compreendendo. Brown acrescenta, porém, que "Lucas não deixa Maria na nota negativa do mal-entendido. Ao invés, em 2251 [ "sua mãe guardava todas estas coisas ..."] ele enfatiza sua retenção de que ela ainda não entendia e ... sua busca contínua de compreender."[2]

Claro que, no final, Lucas descreve Maria como bem sucedida fazendo a viagem espiritual à família da fé; em Atos 1.14, quando os apóstolos se reúnem no Cenáculo, depois da ressurreição e ascensão de Jesus, Maria está com eles. Mas a história de Simeão e Ana sugere que Maria tinha muito a aprender antes que ela pudesse entrar no Reinado, e à família espiritual de fé, a qual eles já pertenciam, e a qual é a principal família de Jesus na era escatológica.

A história de Natal de Lucas é cheia de reversões surpreendente de fortunas e papéis, em que pessoas de fora tornam-se colaboradores mais íntimos do que membros da família, e na qual as mulheres desempenham um papel mais ativo do que os homens. Desta forma, Lucas também se prepara para os sinais de um de seus temas principais, no Evangelho de Lucas e em Atos- pelo menos, os últimos e os perdidos estão tornando-se os maiores, os primeiros e os encontrados com a vinda de Jesus. Lucas retrata a ascensão de uma forma de judaísmo que invoca o testemunho de mulheres assim como os homens, e que iria permitir-lhes mais uma vez preencher papéis de anciãos como Miriam.

O primeiro Natal e o menino Jesus vieram em um determinado ponto no tempo, mas para muitos, como Maria e José, a importância do evento somente poderá ser entendida de forma incremental e ao longo de muitos anos. Mas a intuição profética para com intenções de Deus é um dom o qual se mantém a prover e renovar o povo de Deus. E no início de uma longa cadeia de tais visões proféticas permanecem Simeão e Ana, uma certeza de que a profecia foi cumprida e a outra apontando para o futuro, um futuro tão brilhante quanto as promessas de Deus.

1. Veja Alfred Plummer, Luke, International Critical Commentary (Edinburgh: T & T Clark, 1905), p. 71.
2. Raymond E. Brown e Karl P. Donfried, eds., Mary in the New Testament (Philadelphia: Fortress, 1978), pp. 161–162.

26 de dezembro de 2009

Santo Estêvão,arquidiácono, e mártir

Santo Estêvão, consagrado diácono pelos apóstolos [Atos 6.5-6],é apresentado no livro de Atos [6.8-7.60] martirizado após um discurso aos judeus, com uma denúncia profética a respeito da queda espiritual do culto ligado ao serviço oficial do Templo, e o discurso legitimador deste serviço e instituições relacionadas. Ele atesta desde cedo o caráter multiforme do movimento cristão, com pessoas oriundas de diversos segmentos no ideário do Judaísmo do Segundo Templo e relacionados a ele. Seu sermão parece trabalhar em cima da Torá Samaritana. Vemos isso quanto à idade de Terak apontada como 145, não 205 anos. Abraão sepultado em Siquém. Filo de Alexandria, em “De Migratione Abrahami”, coloca que Abraão deixou Harran depois da morte de Terak; também no destaque dado a José podemos perceber ecos da leitura samaritana, como também a oposição à centralização do culto no templo de Jerusalém.

Após o martírio de Estêvão, assistido por nada mais nada menos o apóstolo Paulo - então anti-cristão - desencadeou-se uma severa perseguição aos cristãos, havendo uma dispersão destes, e os "judeus helenistas" encontrando acolhida em Samaria.

Coleta para o dia de Santo Estêvão, no Livro de Oração Comum da Igreja Anglicana:

Damos-te graças, ó Senhor da glória, pelo exemplo de
Estevão, o primeiro mártir da tua Igreja, que, olhando para
o céu no momento do seu martírio, intercedeu pelos seus
perseguidores junto a Jesus Cristo, teu Filho, que está à tua
direita no céu, onde vive e reina contigo, ó Pai, e com o
Espírito Santo, um só Deus agora e sempre.
Amém.


Hino da Igreja Ortodoxa dedicado a Santo Estêvão:
Rumo a Estêvão, iluminado pelo Espírito,
Os assassinos judeus acorreram.
O ensangüentado Estêvão ajoelhou-se
E em alta voz clamou a Deus:
"Ó Senhor, Que da Cruz perdoaste
O maior pecado que jamais abalou a terra,
O maior pecado que o céu jamais contemplou:
Perdoaste Teus assassinos.
E agora, ó Graciosíssimo, perdoa-me a mim também!
Este crime – que é comparado àquele?
E eu, que sou, comparado ao meu Senhor?"
Dizendo isso, entregou seu espírito a Deus.
Os anciões furiosos, covardes feios,
Dispersaram-se depois de o matarem.
Então do céu desceram anjos
Ao redor do corpo do Protomártir.
Cantaram em coro um hino a ele
E levaram ao Paraíso a sua alma paradisíaca.

20 de dezembro de 2009

A Natividade Segundo Lucas

Tradução de texto publicado na Biblical Archaeology Review

por Ben Witherington

As porções de Natal do Evangelho são, talvez, as mais amadas, e os mais elaborados textos do Novo Testamento. Como obras de arte que foram lacadas com revestimento após a camada de verniz, as histórias originais são dificilmente visíveis ainda. Hoje, é difícil imaginar o Natal sem boi e um burro, por exemplo, embora nem Mateus nem Lucas mencionem animais. (Ao invés, São Francisco, o amante medieval grande de animais, é creditado com a construção do primeiro presépio completo com animais vivos.) Os três Reis Magos também são dispositivos elétricos permanentes em nossa imagem da Natividade, embora eles não cheguem, segundo Mateus 2, até vários dias após o nascimento de Jesus (a epifania para os pastores, no entanto, tem lugar no mesmo dia).

Talvez revisitando a história de um ponto de vista do historiador pode remover algumas dessas impressões equivocadas, estas camadas de verniz, e vamos ver a obra-prima nas suas brilhantes cores originais.

Parte do problema hoje é que nós tendemos a confundir os relatos de Mateus e de Lucas em uma história de Natividade. Para contrariar esta situação, nesta coluna vamos nos limitar a alguns versículos de Lucas.

No momento do nascimento, José e Maria estão em Belém, na casa dos ancestrais de José, onde o casal viajara, segundo Lucas 2:1-5 , para participar de um censo.[1]

Como Lucas 2:5 diz claramente, José e Maria estão envolvidos, e Maria está grávida. Casamento no judaísmo antigo era tão obrigatório como o casamento moderno é hoje. Era necessária a dissolução formal para anular tal compromisso. Mulheres judias estavam geralmente entre 11 e 13 anos, quando noiva, e os homens eram, em geral um pouco mais velhos. Casamento no judaísmo envolvia um pacto entre um homem e uma mulher, e o compromisso era para ser uma aliança de vida, embora aos homens eram permitidos alguns motivos para o divórcio. O que é importante a lembrar é que em uma cultura de honra e vergonha, como o judaísmo, era um escândalo engravidar fora do casamento ou antes do casamento. Das noivas era absolutamente esperadas serem virgens quando se casassem.

Se Belém foi a cidade onde viviam os parentes de José, então é natural esperar que José e Maria tivessem procurado primeiro acomodações com a família. Este parece ser o que eles fizeram. Não é o caso de Maria e José terem sido forçados a parar em algum lugar ao lado da estrada, porque de repente, Maria entrou em trabalho de parto. Ao contrário, Lucas 2:6 nos diz que "enquanto eles estavam lá", isto é, em Belém, "chegou o momento para ela dar à luz ao seu filho."

Onde ficaram hospedados em Belém? Lucas diz-nos que, após o nascimento, Maria colocou o bebê em uma “manjedoura", ou pequeno paiol, porque "não havia lugar para eles na kataluma "(Lucas 2:7)-um termo grego que outrora se usava para significar “sala de hóspedes" (ver Lucas 22:11). Quando Lucas quer falar de uma pousada, que ele chama de pandocheion (cf. Lc 10:34). Assim, Lucas não diz nada sobre o Santo casal sendo expulso de uma pousada e de Maria ter de abrigar a criança em um celeiro. Historicamente, é muito mais provável que Maria e José tiveram seus filhos na parte de trás da humilde casa ancestral onde os animais mais valorizados eram alimentados e, no inverno, alojados, porque o quarto na casa da família já estava ocupado. Em qualquer caso, Belém era uma pequena aldeia, em uma estrada secundária, na qual não é ainda claro que tivesse uma pousada. É certo que, os inícios de Jesus eram humildes, mas não temos necessidade de mitificá-los em alguma história sobre um bebê que está sendo expulso pelo mundo.

Lucas sugere que este nascimento nunca foi de alguma forma milagrosa ou incomum. (O milagre é dito ter acontecido antes, na concepção de Jesus.) Mas, em um pasto nas proximidades, havia muita folia celestial.

Em Lucas 2:9, "um anjo do Senhor" aparece antes de alguns pastores, que estão "mantendo a vigília do seu rebanho durante a noite."

O episódio sobre os pastores, que ocupa mais espaço do que a discussão sobre o parto em si, tem uma certa plausibilidade histórica, uma vez que Belém foi uma das principais áreas próximas de Jerusalém, onde os ovinos eram levantados para o sacrifício no Templo. Devido à sua profissão, os pastores eram vistos como camponeses impuros por alguns judeus antigos, mas Lucas vê-los como exemplos dos marginalizados, para quem o nascimento de um salvador seria visto como uma boa notícia na verdade (cf. Lc 1:52, 4:18 ).

Através da Bíblia, os anjos são arautos da atividade divina e mensageiros de Deus, e o anjo de Lucas 2 não é exceção. Lucas 2:9 fala da glória do Senhor brilhando em torno do anjo e dos pastores, uma referência para a brilhante e luminosa presença, ou Shekinah, de Deus. Naturalmente, os pastores estão assustados com a visão.

“Não tenham medo", o anjo tranqüiliza os homens, “vejam - eu estou trazendo boas novas de grande alegria para todo o povo: nasceu-vos hoje, na cidade de Davi, um Salvador, que é o Messias "( Lucas 2:10-11). O anjo enfatiza que o Salvador nasceu "para vocês"- os pastores, isto é, aos menores, os últimos e os perdidos.

O anjo diz aos pastores que eles encontrarão o bebê envolto em panos e deitado em um pequeno paiol. Isso ele oferece como um "sinal" ou prova de que ele está dizendo a verdade sobre o nascimento do Salvador.

A linguagem sobre “salvador” utilizada pelo anjo aos pastores na abordagem baseia-se na retórica do culto imperial, nos dias de Lucas. Durante todo o império, inscrições prepotentes comemoravam o nascimento do imperador que havia "pacificado" toda a região em torno do Mediterrâneo. César é descrito como um deus caminhando na Terra em carne e osso. Em seu Evangelho, Lucas está usando essa mesma linguagem, retratando a criança judia de origem humilde, Jesus, como o salvador real, o verdadeiro Senhor, cuja vinda vai trazer a paz na terra em comparação com o imperador Augusto, que é apenas um pretendentee falsificação.

Quando os pastores ouvem as notícias "que o Senhor deu a conhecer a nós" (Lucas 2:15)- para tomarem o anjo como sendo porta-voz do próprio Deus, eles vão para o paiolzinho com pressa para ver com seus próprios olhos o sinal de confirmação . Eles então saem como os primeiros evangelistas ou anunciadores da Boa Nova. As boa novas não são apenas sobre se ver Jesus, também envolve o encontro com o anjo.

É afinal a palavra angelical que ajuda a interpretar corretamente o público do evento: Esta criança é alguém especial, humana, mas divina. É por isso que todos os que ouvem a prodigiosa proclamação dos pastores, incluindo a própria Maria. A tradução de John Nolland aqui capta o espírito do texto: Após os pastores "fazerem conhecer" o que lhes tinha sido dito sobre essa criança, "Maria guardava todas estas coisas, tentando em seu coração penetrar o seu significado" (Lucas 2:17, 19) .[2] Maria é assim retratada como mansa e, portanto, a caminho de se tornar uma verdadeira crente.

Assim, a história está cheia de momento histórico, e igualmente, cheia do miraculoso. Ela realmente não precisa de toda a campanha publicitária extra de Natal. Os historiadores antigos, ao contrário dos modernos, raramente tinham preconceitos com relatar coisas sobrenaturais assim como naturais. (Podemos refletir sobre quem é mais esclarecido, nós ou eles?) .

Tudo o que nós fizemos desta história, tem claramente gerado um enorme legado de graça, bênção e dom através de dois milênios. Na sua forma original, é um lembrete de que os caminhos de Deus raramente são os nossos caminhos. Como o poeta escocês George MacDonald disse certa vez: "Eles todos estavam à procura de um rei, para matar seus inimigos e exaltá-los: não esperavam, uma coisa bebezinha, que fez uma mulher chorar".


NOTAS


[1]Muita tinta foi gasta em Lucas 2:1-2, em relação ao aparente erro de sugestão de Lucas que Maria e José viajaram para Belém para participar de um amplo censo mundial realizado por Quirino, governador da província da Síria (que incluía a Judéia nesse ponto). Basta dizer aqui que é perfeitamente viável traduzir "este primeiro recenseamento aconteceu (antes de que) Quirino fosse governador da Síria." Embora possa haver algum exagero retórico na referência a todo o "(conhecido)" mundo a ser registrado no censo de Quirino, Augusto perseguiu uma política de direta tributação em toda a província imperial do império; Judéia era parte de uma província imperial, então um recenseamento é perfeitamente viável. Veja a discussão detalhada de John Nolland, Luke 1-9:20 (Waco, TX: Word, 1993), pp. 9-103 e toda a bibliografia lá.

[2] NOLLAND, Lucas 1-9:20, p. 97. O grego aqui se refere não apenas a acumular idéias, mas valorizando e avaliando-as, ruminando sobre elas, porque o seu significado não é imediatamente aparente. Isso seria o oposto de alguém que é duro de coração e imediatamente rejeita a mensagem. Veja a discussão em Ben Witherington III, Mulheres no ministério de Jesus (Cambridge: Cambridge University Press., 1987).



Ben Witherington é professor Amos de Novo Testamento para estudos de doutorado no Seminário Teológico Asbury e na faculdade de doutorado na Universidade de St. Andrews, na Escócia. Com uma graduação da UNC, Chapel Hill, ele recebeu a M. Div. grau de Gordon-Conwell Theological Seminary e Ph.D. da Universidade de Durham, na Inglaterra. Ele agora é considerado um dos estudiosos evangélicos top no mundo, e é um membro eleito do prestigioso SNTS, uma sociedade dedicada aos estudos do Novo Testamento. Dr. Witherington apresentou seminários para igrejas, colégios e eventos bíblicos nos EUA, Inglaterra, Estônia, Rússia, Europa, África do Sul, Zimbábue e na Austrália. Ele já escreveu mais de trinta livros, incluindo The Quest Jesus: The Third Search for the Jew of Nazareh e The Paul Quest, ambos os quais foram selecionados como top de obras de estudos bíblicos por Christianity Today. Além de suas muitas entrevistas em redes de rádio de todo o país, o professor Witherington foi destaque no History Channel, NBC, ABC, CBS, CNN, Discovery Channel, A & E, e na Rede PAX

13 de dezembro de 2009

Vamos ver a Estrela

O Cristianismo nasceu e começou a ser pregado em civilizações onde festas e celebrações constituíam uma parte orgânica e essencial da geral concepção do mundo e estilo de vida...E, acreditemos ou não, o Cristianismo aceitou e fez seu esse fenômeno humano de festa, como também aceitou e fez seu o homem todo com todas as suas necessidades.
Alexander Schmemann, Sacramentos e Ortodoxia.

Augusto Frederico Schmidt(1906 – 1965)

Poemas em Louvor de Jesus Cristo - O Nascimento
Vamos ver a Estrela!
Sairemos pelas estradas, cantando,
Sairemos de mãos dadas,
E acordaremos as brancas e tímidas ovelhas.
Iremos surpreendê-Lo, Pequenino e Simples,
Sua Inocência Iluminará os caminhos felizes, dormindo.
Vamos ver a Estrela!
photo



8 de dezembro de 2009

Reverência ao Criador, responsabilidade com a criação

De 07 a 18 de dezembro acontece a 15ª Conferência das Partes da Convenção da ONU sobre Mudanças Climáticas - COP 15, em Copenhague, Dinamarca, mobilizando delegações do mundo inteiro, chefes de estado, representações diplomáticas, institutos de pesquisa, organizações não-governamentais.

Links recomendados:
Cop 15 - Copenhague 2009: Especial da BBC Brasil
Observatório do Clima

Confira também as organizações e espaços de reflexão/mobilização cristã na seção Ecumenismo no nosso blog "Cristianismo, meramente".



Oração

Deus Criador, a Terra é miraculosa e linda. Perdoe nossa confusão e inação ao nos confrontar com os desafios que as mudanças climáticas nos apresentam. Na luz de Sua verdade, ilustrada tão nitidamente através da vida e dos ensinamentos de Jesus, ajude-nos à reexaminar a nós mesmos e as escolhas relacionadas aos nossos estilos de vida. Ajude-nos à perceber as implicações que nosso modo de viver tem nas outras formas de vida na Terra. Que nós possamos seguir Sua liderança e cuidar de todo aspecto desse precioso mundo, que Tu fizeste e que Tu amas.

Nós oramos pelos líderes mundiais, que eles possam concordar num tratado novo, justo e radical em Copenhague que possa proteger e conservar nosso mundo frágil para as futuras gerações. Através da história o Senhor tem movido pessoas à realizar coisas incríveis pelo amor de seus próximos. Inspire-nos a trabalharmos juntos, como Seu povo, para mudar as prioridades na maneira em que vivemos, para que nós possamos construir um mundo justo e seguro para toda a Sua criação; um mundo aonde Sua vontade seja feita como nos céus. 
Amém.

Viver bem com baixas emissões de carbono

Essa Oração pelo Clima foi escrita pela organização Climate Stewards (Zeladores do Clima), um programa da organização A Rocha,  com o objetivo de ajudar as pessoas a reagirem às mudanças climáticas. Para saber mais sobre ‘viver bem com baixas emissões de carbono’ em Inglês, acesse o site http://www.climatestewards.net/

Atualizações diárias de orações

Dê uma olhada no twitter.com/climateprayer. Com mais de 1900 seguidores, está entre os 2% dos sites mais visitado do Twitter. Você pode expor esse material no seu próprio site, Facebook, Myspace usando o código do www.climatestewards.net/cs-int-en/resources/getprayers.html



*Imagem: Rio São Francisco - Velho Chico
Fotografia nossa - nascer do sol em Januária/MG.

5 de dezembro de 2009

Belém - Ele veio pequeno, dos pequenos, entre os pequenos, para coisas grandes...

Canta o clássico hino natalino que o Senhor “nasceu em Belém”. Belém, Bayt Laḥm, que significa “Casa do Pão”.

Atualmente, podemos ver um crescente descrédito em relação aos apontamentos dos evangelistas sobre o nascimento em Belém. Destaco que tal ceticismo é partilhado por estudiosos de diversas vertentes e posições, sérios, sóbrios, centrados. Eu penso que essa é uma polêmica difícil. De certa forma, o raciocínio que levaria ao nascimento ter acontecido em Nazaré seria levado mais pela via negativa do que positiva. Ademais, há pouco tempo muitos não teriam aceitado essa tese (talvez até muitos dos estudiosos mais velhos hoje que defendem-na) porque acreditavam que Nazaré não existia...

Quanto ao período em relação a Quirino, temos algumas controvérsias. Há uma ênfase comum nos evangelistas situarem o nascimento de Jesus à época de Herodes, o Grande, rei da Judéia, que morrera em 4 a.C. Mas tendo provas de que Quirino fora empossado no governo da Síria em 6 d.C., havendo a aí registro de um inventário humano feito por Arquelau [ mencionado por Flávio Josefo]; haveria uma grande discrepância irreconciliável. Também se questiona a existência de recenseamentos do gênero.

Porém, o arqueólogo John McRay, autor de “Archaeology and the New Testament”, apresenta um exemplo de recenceamentos semelhantes:
Gaio Víbio Máximo, prefeito do Egito (declara): Tendo chegado o momento de realizar a censo de casa em casa, é necessário que se requeira a todos os que, por algum motivo, residam fora de suas províncias, que retornem às suas casas, para que cumpram o que requer integralmente a ordem do censo, e possam também atender diligentemente ao cultivo da parte que lhes cabe.
Ele aponta também que há um papiro, de 48 d.C, dando a entender que o censo era algo que envolvia a família toda. Ocorria a cada 14 anos, segundo esse arqueólogo. Houveram censos de Herodes em agosto de 7 a.C. em Belém, 3 anos antes de sua morte, num período compreendido dentre 3 anos (8 a 6) em que houveram recenseamentos gerais.

Considerando isso, refletimos sobre os possíveis períodos. Considerando a moeda descoberta pelo arqueólogo Jerry Vardaman –citado por McRay - com o nome de Quirino em letras "micrográficas", fazendo dele procônsul da Síria e da Cilícia de 11 a.C. até depois da morte de Herodes, 4 a.C.; tendo documentado que ele fora governar a Síria em 6 d.C., pode-se inferir dois governos, de caráter diferente, de Quirino. Quirino realizara uma missão militar entre 12 - 6 a.C., havendo registros em escritos sírios de censos realizados na Judéia a partir de 12 a.C. (que não fora o inventário de Arquelau no ano 6 d.C.). Até a chegada do recenseamento à Judéia, que poderia ter levado um bom tempo, teria dado tempo de José e Maria terem chegado à Belém para o nascimento.

Outro cenário também pode ser delineado:

Uma aferição alternativa da passagem do evangelho de Lucas, no original em grego " "auth apografh prwth egeneto hgemoneuontoV thV suriaV kurhniou" poderia apontar que o censo se dera antes de Quirino ser o governador da Síria, sendo ele incumbido pelo imperador responsável pelo recenseamento, Augustos, sem ser o governador; a tradução em Lucas ficaria "Este censo aconteceu antes de Quirino se tornar governador da Síria", conforme propõe John Nolland em seu comentário sobre os dois primeiros capítulos de Lucas. John McRay aponta que o termo hégemoneuontos , que Lucas emprega, era usado também para o exercício de "procurador", e legatus era mais comum para "governador". De fato, o teólogo patrístico Tertuliano de Cartargo considerava que o censo foi feito quando o legado na Síria era Sentio Saturnino, em 9-6 a.C., unindo à Síria os territórios de Arquelau; época que ocorrera a revolta farisaica e a insurreição de Judas, o Galileu.

Tal quadro seria coerente com o reconhecimento do período de Quirino como procônsul da Síria e Cilícia, como mencionado acima.

Isto, ponderando que José e Maria tivessem chegado lá antes, e não na noite do nascimento como se costuma dizer. É coerente com Lucas: "E aconteceu que, estando eles ali, se cumpriram os dias em que ela havia de dar à luz", sugerindo que esperaram dias. Nesse caso, poderíamos imaginar que na verdade Maria teria chegado uns bons dias antes de dar à luz. Teríamos que pensar numa hipótese alternativa à da gruta. A palavra empregada kataluma, concordando com Marcos 14.14-15, poderia indicar um quarto de hóspedes. Para os dois relatos - considerando que são narrativas de episódios sui generis, que buscam repassar um significado especial e não descrições dissertativas frias - poderem ter um relativo grau de coerência, se consideraria que o episódio da matança dos inocentes, e a chegada dos magos, teria se passado um bom tempo, entre um a dois anos, após a natividade de Lucas.
No mais, caso a tradição fosse mesmo lendária, teríamos que admitir que o nascimento em Belém seria uma lenda bem precoce pelos critérios que examinam ambas as tradições, de Mateus e Lucas, e compartilhada com grande repercussão e crédito entre as comunidades cristãs, mesmo as não provenientes de adeptos do judaísmo, pois temos indícios de que desde os primórdios do cristianismo primitivo esta cidade era local de devoção. Registra-se que em 135, o imperador Adriano mandou construir, sobre a gruta de Efrata, um templo dedicado ao deus Adone, para contrapor à devoção cristã ao no lugar e abafá-la. Justino de Roma, nascido na Palestina, já o menciona o nascimento numa gruta em Belém, décadas após os evangelhos serem escritos, no Diálogo contra Trifão. e menciona, uns cinqüenta anos mais tarde, que Jesus nasceu em uma cova de Belém. Podemos vê-lo também nesta época em alguns textos apócrifos, como o Proto-evangelho de Tiago (+/- 150 d.C.), 17. Orígenes pouco mais tarde, também (Contra Celso I, 51). Também o “Pseudo-Mateus”, 13.

De fato, Belém poderia ser uma projeção apologética dos discípulos, de defesa da fé messiânica em Jesus como Aquele em quem Deus visitava Israel e os seres humanos; contudo, seria insuficiente como tal, pois eles apresentam que muitos o consideravam de Nazaré, debochando (detalhe que não passaria despercebido nesse caso, merecendo um comentário dos evangelistas como “contudo não sabiam que era de Belém”). Então tal tese não convence.


Alguns mencionam que o fato do extermínio das crianças por parte de Herodes não teria passado despercebido de historiadores como Flávio Josefo. Contudo, devemos considerar o porte do evento, alguma coisa relacionada a “Casus Belli”,e a trajetória geral de Herodes. Neste último fator, diante dos precedentes de chacinas de Herodes ante sua família e várias pessoas próximas a si, e outras tantas atrocidades, não seria algo excepcional. Dada também a magnitude de Belém, sendo que Raymond Brown no livro “O Nascimento do Messias” estima que a vila tinha cerca de mil habitantes na época, e o fato não se relacionar a alguma insurreição coletiva ou guiada por líderes carismáticos, afastamos o “casus belli”; e, considerando que Brown e outros estimam que o infanticídio atingiria cerca de 20 crianças, que se enquadravam na ordem dada, fora um evento então que poderia sim não ter chamado a atenção de Josefo e outros. Flávio Josefo, um fariseu versado nas discussões rabínicas, nada comenta em sua obra, nem menciona, um dos mais importantes deles que foi um divisor de águas, o rabino Hillel. Fílon de Alexandria e demais escritos rabínicos não mencionam João Batista. Simão Bar Kochba, o líder da insurreição dos judeus em 132-135 d.C., não é mencionado por Díon Cássio, historiador contemporâneo que escrevera sobre a revolta. Então, não é de se assustar com certas ausências de questões importantes em obras da época.


Vivia-se tempos tensos para com Herodes; ele era um governante déspota e sanguinário, obcecado em matar rivais; mas pouco antes houveram revoltas populares importantes, maciças, e não poderia mostrar fraqueza a ponto de ir pessoalmente conferir uma história contada por estrangeiros de que numa vilazinha nascera seu futuro rival, e que ressoaria profecias messiânicas; isso repercutiria em toda sua província e além, o que além de ser politicamente ruim para sua imagem com outros representantes romanos como procuradores, prefeitos, etc. (podendo chegar ao imperador), interpretariam essa exibição de fraqueza como sinal para uma nova revolta e surgimento de novos líderes.

Onde então podemos ver que não há cenário para uma investigação generalizada, em outras localidades como Nazaré, se por acaso alguém escapou de Belém com uma criança (até porque esse alguém não faria estardalhaço com isso). No seu testamento, Herodes confiara a seu filho Herodes Antipas a herança de seu trono, mas mudara de idéia e designara Arquelau, seu outro filho, mencionado nas narrativas. Poucos anos depois, na sua morte, os dois filhos se apresentaram ao imperador Augusto que repartiu metade do território judaico entre eles, ficando Antipas com a Galiléia e o outro filho, Herodes Filipe, com o extremo norte, e Arquelau com a Judéia e Samaria. É de se esperar Antipas com essa preocupação em suas prioridades?

Reforçando ainda a antiguidade da tradição de Belém, remontando aos períodos iniciais do movimento cristão, adquire assim um peso maior. Dadas estas considerações, considero que Belém ainda se sustenta. Além da força simbólica, a plausibilidade histórica. Pode-se cantar com os pulmões e consciência leve.

BROWN, Raymond E. O Nascimento do Messias: comentário das narrativas da infância nos Evangelhos de Mateus e Lucas. trad. Barbara Theoto Lambert. São Paulo: Paulinas, 2005

GONZÁLEZ, J. Echegaray. “Arqueología y evangelios”, Verbo Divino, Estella 1994

HORSLEY, Richard A.; HANSON, John S. Bandidos, Profetas e Messias. Movimentos Populares no Tempo de Jesus. São Paulo, Paulus, 1995.

JOSEFO, Flávio. Antiguidades dos Judeus contra Apion.  Rio de Janeiro, Editora Juruá, 2001.

McRAY,John. Archeology and the New Testament. Grand Rapids, Baker, 1991.

NOLLAND, John. Luke 1:9-20. Waco, TX: Word, 1993