28 de julho de 2009

Deus Crucificado por Nós

Refletimos anteriormente sobre as compreensões de que, para muito além de especulações abstratas, ou reflexões com base em objetos e seres, Deus se revelou de forma mais visceral e expressiva através do sacrifício de Jesus culminando na cruz. Ali Deus manifesta seu caráter abertamente, no mais próximo do que chamamos “pessoal”. E ali vemos que Deus, longe de ser um déspota indiferente ao sofrimento de suas criaturas, filhos e filhas, participa dele, sofre com eles compadecendo-se e tomando esse sofrimento sobre Si, como a semente da
Redenção Plena de toda a criação que Ele consumará.

Ficaram no ar as perguntas:

isso é apenas uma forçação de barra, uma resposta forçada para que a religião cristã abarque algo que nunca pretendeu, porque hoje as pessoas estariam mais sensíveis ao sofrimento? Ou isto realmente, de forma procedente, fazia parte do cristianismo desde seu nascimento?

E como prometido, vou deixar a tradução que fiz da resenha de um livro, por parte um eminente professor de Novo Testamento. Esse livro, de forma concisa e robusta, responde a estas questões.


Richard Bauckham, God Crucified: Monotheism and Christology in the New Testament. Carlisle: Paternoster,1998; Grand Rapids: Eerdmans, 1999. x+79 pp.

Richard Baukham: DEUS CRUCIFICADO: Monoteísmo e Cristologia no Novo Testamento

Este curto livro é muito mais importante do que seu tamanho poderia sugerir. Uma versão publicada das “Palestras Didsbury” de 1996 no British Nazarene College, em Manchester, que antecipa um estudo por Bauckham de todo o período sobre o mesmo tema. Este professor de estudos no Novo Testamento em St. Andrews [recentemente aposentado – nota do tradutor] já se demonstrou um prodigioso e criativo estudioso evangelical, não só no seu campo atual, mas em áreas que abrangem também teologia sistemática e história da igreja.

Aqui Bauckham aborda o top em duas das abordagens prevalecentes para a compreensão da história cristã precoce em seu primeiro meio-século. Por um lado, muitos estudiosos liberais ainda vêem uma lenta evolução da cristologia [ Cristologia = estudo e doutrina sobre a natureza, origem mais profunda, de Jesus Cristo, relacionando-se com sua pessoa e obra - Nota do Tradutor] tal que a equação de Jesus com Deus poderia ter tido lugar apenas em um contexto helenístico tardio. Por outro lado, cada vez mais estudiosos conservadores e centristas têm recorrido a figuras intermediárias do judaísmo, como anjos exaltados, Melquizedeque e mesmo Moisés, como provas de que judaísmo interstamentário veio a confundir a distinção entre Deus e o homem. Estes precedentes, como tem sido argüido, em seguida permitiram aos judeus cristãos iniciais predicarem a divindade de Jesus de uma forma que o monoteísmo implacável de outros períodos da história judaica (incluindo os existentes) não teria permitido.

Contra esses dois tipos de visões Bauckham argumenta que (1) primeiramente o Judaísmo do primeiro século preservava fortes fronteiras entre Deus e a humanidade, de tal modo que figuras intermediárias não fornecem os precedentes adequados para explicar o que judeus cristãos disseram sobre Jesus, ainda (2) desde as primeiras fases do desenvolvimento cristológico em diante, Jesus foi equiparado com as características de Deus - especialmente sua criação e providência - que mais definiam o monoteísmo judaico. Assim, os crentes não chamavam Jesus de um “segundo deus” ou um “semi-deus”, mas atribuiam-lhe a própria identidade de Yawé.

De forma surpreendente, essas equações frequentemente entram em textos que fazem alusão a passagens do Antigo Testamento que estão falando de Deus, o Pai, com estas mesmas características definidoras de sua identidade, tais como 1 Coríntios 8:6 (aludindo ao Shemá de Deut. 6:4 [Ouve, Israel, o SENHOR nosso Deus é o único SENHOR. – Nota do Tradutor]). Em várias ocasiões-chave, os textos aludem a passagens de Isaías 40-55, especialmente Filipenses 2:6-11, as passagens “Alfa e Omega” do Apocalipse, e os textos joaninos relativos à Cristo sendo "levantado" e "exaltado" (cf. , respectivamente, Isa. 45:22-23, 44:6 e 48:12, e os vários ditos "Eu Sou"). Mas esta é também a seção de Isaías que é permeada com os textos do "Servo Sofredor", especialmente Isaías 52:13-53:12, os quais revelam o Único Deus, Yawé, prometendo que o seu Servo iria sofrer e morrer para expiar os pecados do mundo. Ao mesmo tempo, os mesmos textos do Novo Testamento que ligam Jesus com Deus também contêm alusões ao seu papel como Servo. Portanto, os escritores do Novo Testamento não somente atribuem a Jesus identidade divina, eles simultaneamente melhor definem a Deus como Aquele que vai ser crucificado (daí o título de Bauckham).

Assim, não somente deve ser reescrito muito da história do Novo Testamento, mas duas conclusões surpreendentes seguem para o estudo da teologia histórica. Primeiro, o desenvolvimento da cristologia da igreja primitiva e os seus credos não só é um legítimo desenvolvimento do que está implícito no Novo Testamento, como reformula o contexto para aquilo que é, por vezes, bastante explícito nas Escrituras. Em segundo lugar, as tendências da teologia moderna (contra muitos teólogos antigos) para falarem diretamente de Deus sofrer e morrer são vindicadas (cf. especialmente Barth e Moltmann, ambos com base em precedentes importantes estabelecidos por Martinho Lutero).

Eu não posso encontrar falhas nos argumentos de Bauckham até agora. Aguardamos a plena defesa e documentação de suas teses com grande antecipação. Enquanto isso, esse volume merece ampla circulação, de fato. Pode revelar-se revolucionário!

Craig L. Blomberg
Professor of New Testament
Denver Seminary, Denver, CO

a original está aqui: http://www.denverseminary.edu/article/god-crucified-monotheism-and-christology-in-the-new-testament/

Um comentário:

  1. Tambem os salmos messianicos como o salmos 2,110.118 aludem a uma adopção divina ou mesmo uma geração divina anterior ao tempo.
    Estes salmos tambem poderiam ser utilizados nas cerimonias de coroação,ja que o proprio rei David prefigura a epoca e a pessoa do messias.A Fusão da imagem de Deus numa pessoa humana ou a ideia de um filho de Deus na realidade não é tão alheia ao pensamento judaico como muitos defendem e nem tão tardio

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