24 de novembro de 2009

Clive Staples Lewis

Este domingo, dia 22 de novembro, completaram 46 anos da morte de um dos grandes personagens cristãos do século XX , já bem citado aqui no “Cristianismo, Meramente”. Falecera, coincidentemente, no mesmo dia do escritor Aldous Huxley, e do presidente estadunidense John F. Kennedy.

Dizem, inclusive, que estão prontos os bastidores para a filmagem de "Cartas de um Diabo a seu aprendiz".

Ao meu ver Lewis encarna em sua postura, ou no mínimo é um bom exemplo, da via média da tradição cristã a qual pertencemos, ele e eu, o anglicanismo.Não se entretinha com fileiras das "guerras civis" denominacionais; era ecumênico mesmo sem falar de ecumenismo ou discutir o mesmo: seu cristianismo era ecumênico, inclusivo.

Podemos ver no seu pensamento uma grande valorização da tradição, dos patrísticos e dos mestres medievais (aahhh, como ele contribuiu para desconstruir os preconceitos e a mera associação conotativa negativa com o termo "pensamento medieval"!!!!) e liturgia. Suas concepções doutrinárias frisavam os consensos da Igreja ecumênica. E em questões mais particulares, tranquilamente ele combinava elementos dos reformadores protestantes com o de ortodoxos orientais (especialmente a deificação) com o de católicos-romanos.

Ele tinha a convicção de que se encontra elementos de verdade, beleza e virtude em outras religiões, que Deus podia agir nelas e em/para seus adeptos, sem relativizar a centralidade de Cristo para o cristão. Apelava para a unidade de testemunho e diálogo dos cristãos. E enfatizava a importância fundamental do uso da razão (era convicto e militante da "fé em busca de compreensão").

Destacam-se também suas explorações quanto à arte e a imaginação, valorizando-as como elementos para uma vida humana integral e para se viver uma vida plena em Deus e vitais para explorar toda a potencialidade do cristianismo.

No livro de Lewis, “Além do Planeta Silencioso”, um habitante de Marte, Hyoi, um Hrossa, ensinava ao visitante humano que encontramos significado na vida nas lembranças. Que os momentos importantes ganham vida mesmo, até vontade própria, quando os recordamos, e então brincamos com eles, sentimos o seu real valor, e por mais paradoxal que seja, não se perdem, tal qual se perdem no instante em que são vividos. Assim, os Hrossa lidavam melhor com as limitações na vida e com o problema da morte. Hyoi dizia: "E como poderíamos suportar viver e ver o tempo passar se estivéssemos sempre desejando que um determinado dia ou um determinado ano voltassem, se não soubéssemos que cada dia de uma vida enche toda aquela vida com esperanças e recordações e que estas é que são aquele dia?"

Penso que uma das coisas mais relevantes para o nosso momento seria o proveito que ele traz para se promover o senso artístico, estético e estilístico dentre os cristãos. Mesmo que o campo artístico dele fora a literatura, ele teceu bases para subsidiar toda uma reflexão sobre a fé cristã e a arte, a imaginação, a apreciação dos símbolos para além do âmbito psicológico, que infelizmente o pensamento moderno tentou (ainda que incoerentemente) os reduzir. E sempre enfatizando o esforço pela qualidade, porque o que tem de "artistas" fazendo coisas chinfrins usando como subterfúgio o discurso de que (se é pra Deus não importa). Bem, a questão não é de não serem "graandes" obras ou chinfrins, mas de que nem ao menos vemos preocupações ou cobranças quanto a qualidade. E não só para com os artistas, mas também ele proporciona elementos para a apreciação da arte, por parte do público cristão.

Há algo que queria, de coração compartilhar. Está no livro de C.S.Lewis, “Cristianismo Puro e Simples”. É um livro ótimo, com palavras claras, coerência, com idéias amplas e conexas, exigindo concentração e proporcionando edificação e deleite. E essa é uma mensagem que ele nos deixa, apontando de forma perspicaz algo bem negligenciado:

Quando alguém faz uma escolha moral, duas coisas estão envolvidas. Uma é o ato da escolha. A outra, são os vários sentimentos, impulsos, e tudo o mais, que o seu equipamento psicológico lhe fornece, e que são a matéria-prima da escolha. Bem, essa matéria-prima pode ser de dois tipos. Tanto pode ser o que chamaríamos de normal, consistindo dos sentimentos que são comuns a todos os homens, ou então são sentimentos inteiramente anormais, decorrentes de coisas erradas do subconsciente. Assim, o medo de coisas que são de fato perigosas é um exemplo do primeiro tipo, e o medo irracional de ratos ou aranhas é um exemplo do segundo. (...)Podemos ainda expor a mesma coisa de outro modo.

Muita gente, que parece ser muito amável, na verdade pode ter feito tão pouco uso da sua boa hereditariedade e da sua boa educação, que talvez seja bem pior do que alguém que seja tido como um demônio. Poderíamos ter certeza de como seria o nosso comportamento, se tivéssemos tido de suportar a carga psicológica, e ainda a má educação, e ainda o poder de alguém como Himmler (líder Nazista da Gestapo, que suicidou em 1945)?

Eis as razões porque se diz aos cristãos que não devem julgar. Só vemos os resultados das escolhas feitas com a matéria-prima de cada um. Mas Deus não julga ninguém com base nessa matéria-prima, mas sim segundo o uso que faz dela. A maior parte da configuração psicológica do homem é provavelmente devida a seu corpo; quando este morrer tudo desaparecerá com ele, e a parte central real do homem, aquilo que escolhia e que fazia o melhor ou pior uso do seu material, aparecerá em sua nudez. As belas coisas que supúnhamos serem nossas, mas que eram na verdade devidas a uma boa digestão, cairão de alguns de nós; as coisas torpes que eram devidas a complexos ou má saúde, cairão de outros. Pela primeira vez, então, veremos cada um como realmente é. Haverá surpresas.


Nenhum comentário:

Postar um comentário