12 de outubro de 2011

Fé Mesquinha

Foi grande a minha alegria no Senhor, porque finalmente vi florescer vosso interesse por mim; verdade é que estáveis sempre alerta; mas não tínheis oportunidade. Falo assim não por causa das privações, pois aprendi a adaptar-me às necessidades; sei viver modestamente, e sei também como haver-me na abundância; estou acostumado com toda e qualquer situação: viver saciado e passar fome; ter abundância e sofrer necessidade. Tudo posso nAquele que me fortalece. Entretanto, fizestes bem em participar da minha aflição.
Carta aos Filipenses, 4.10-13.

Paulo mostra-se feliz com a solicitude dos filipenses, mas menos pelo que esta lhe supriu e proporcionou, e mais pela edificação e crescimento espiritual que proporcionou aos mesmos, o que operou em termos de virtude e aprofundamento na vivência da fé.

Depois, ele se mostra consciente de que em Cristo, ele basta-se a si mesmo, menos do que posses ou falta de posses. Elas são acessórios, para um fim maior, e não a meta para a qual ele mira.

Importante mostrar todo o contexto desta passagem, porque uma imagem de fé porca, deturpada e tacanha tem isolado a passagem “tudo posso naquele que me fortalece” para pregar uma ética bem acoplada ao espírito consumista de nosso tempo, em que nossa meta está em mostrar nosso valor, para os outros e para nós mesmos, nos bens que conquistamos. Assim, podemos conseguir qualquer coisa, porque temos o direito pelo fato de puxarmos-saco de Deus. Barganhamos com Ele. E é pra isso que serve a fé e comportar-se de acordo com o “padrão da igreja”, para obtermos as coisas. “Tudo o que eu quiser, o cara lá de cima vai me dar”.

Assim, com consciência tranqüila, pomos no carro um adesivo “presente de Deus”, sem refletir como veríamos Deus então caso este carro se perca? Deus estaria então no seguro? E caso um grande revés na vida nos faça perder o carro ou outros bens, “presentes de Deus”, acabou-se o encanto? Deus deixa de existir?

Tudo é muito fugaz na vida. E vulnerável. A felicidade é o que há de mais vulnerável e fugaz então. Logo, não é ruim termos acesso a coisas úteis, mas é perder a alma se fiar nelas, e mais direcionar a fé para elas.

Nesta entrevista, Zygmunt Bauman põe o dedo na ferida e de forma profética, coloca a espiral de consumismo e materialismo utilitarista em que estamos imersos. Diagnostica como ninguém os males da vida contemporânea ao refletir sobre as revoltas ocorridas em Londres recentemente.

(...)”Todos nós fomos coagidos e seduzidos para ver o consumo como uma receita para uma boa vida e a principal solução para os problemas.” (...)”Enquanto não repensarmos a maneira como medimos o bem-estar, sim. A busca da felicidade não deve ser atrelada a indicadores de riqueza, pois isso apenas resulta numa erosão do espírito comunitário em prol de competição e egoísmo. A prosperidade hoje em dia está sendo medida em termos de produção material e isso só tende a criar mais problemas em sociedades em que a desigualdade está em crescimento.

Esta é a religião de Mamon em nosso tempo, e ela tem conquistado e dominado linguajares cristãos de forma ampla, e na verdade, muitos têm se aproveitado ao perceber que é uma receita verdadeiramente “milagrosa” para fazer “igrejas” crescerem e ter poder sobre a mente de pessoas, desde que dê a elas o analgésico motivacional necessário.

E nos transformamos em nacos de carne ambulante que repetimos chavões religiosos que os macacos-chefe mandam...

Nenhum comentário:

Postar um comentário