1 de maio de 2011

Perpassamos

Em verdade, em verdade eu vos digo que chorareis e vos lamentareis, e o mundo se alegrará; vós ficareis tristes, mas a vossa tristeza se converterá em alegria. A mulher, quando está para dar a luz, tem tristeza, porque a hora é chegada; mas depois de ter nascido o menino, já não se lembra da aflição, pelo prazer que tem de ter nascido ao mundo um homem. Assim também agora vós tendes tristezas;mas outra vez vos verei; e o vosso coração se alegrará, e vossa alegria ninguém poderá tirar.
Evangelho Segundo São João,15:20-22

Por que buscar nessa passagem que remete a uma Esperança de Renascimento, de raios de sol que atravessarão a cortina sombria, se está numa época de chegada, nascimento?..

Pois este jogo Nascimento-Morte-Ressurreição é o princípio organizador que dá a tônica da narrativa da vida de Jesus.

Pois bem, o que veio a Ele ao nascer?..Alguns astrólogos árabes ou persas com símbolos de Poder (ouro), de Sagrado (incenso) e sinal de Morte, a Mirra (usada nas tradições funerários da Ásia Meridional e Nordeste da África para perfumar os corpos dos falecidos)... Aí vemos, no doador da Vida, um dos segredos desta, que como não poderia deixar de ser, é algo muito simples, mas profundo e inesgotável.

Temos a Vontade de Desfrutar. Para nos sentir e afirmar como vivos, queremos desfrutar a vida, dançar a vida, beber a vida, comer a vida, sorver a vida, nadar a vida, sorrir a vida, cantar a vida...e sempre, manter assim. E é bom sermos responsáveis o suficiente para tentarmos fazer isso tudo (pensaram que iria falar o quê?) “Quem não receber o Reino de Deus como uma criança, de maneira nenhuma entrará nele”. Pois é...o menino e o moleque. “Se você é jovem ainda”...

Mas, a questão é que este deleite não nos pertence. O desejo de viver é maior do que nós. Não podemos reter...e talvez seja por isso que precisamos de Ressurreições...Queremos saborear os momentos e experiências de brincar com a vida, gingando com ela, segurar forte para tê-lo à mão quando estivermos no momento do medo, e perguntarmos, teremos isto de novo (pois não é como argila que se molda, mas como areia que nos escapa entre os dedos ao fechar a mão)? E essa porta que abre, nos levará para um caminho seguro? Ou serei um fatigado que lembrará que a vida já foi inebriante?

Estamos sós...é um momento de morte...e o mundo lá fora se alegrando...eles lá longe estão festejando...

Soneto 64, Shakespeare :
A ruína me faz ruminar uma idéia,
que o tempo há de vir arrebatar-me o amor.
Para mim isto é morte e não posso senão
Tua perda temer, e chorar por te ter.


Tudo o que amamos morre um dia (mesmo nós próprios). Ainda mais os amores passageiros...e a criança de cada instante de plenitude de alegria, cada uma delas que sai de nós, rebelde e serelepe, sem-vergonha na hora, será sacrificada....

Quem nos desviou assim, para que tivéssemos
um ar de despedida em tudo o que fazemos? Como aquele
que partindo se detém na última colina para contemplar
hesitante, e aguarda _assim vivemos nós,
numa incessante despedida
”. Raine Marie Rilke

Mas o ano, a vida, não acabou...sentir nessa hora de dor solitária, que a vela queima, os chutes da criança pedindo pra nascer... que podemos “dar à luz” se deixarmo-la “romper o ventre”.
Por isso, a necessidade da mensagem de Morte, antes da mensagem de Ressurreição. A mirra vem antes do cantar dos anjos.

“We can’t get known, satisfaction”: “ Na Terra, somos viajantes sempre prontos para partir. Significa que devemos continuar avançando. Portanto, esteja sempre insatisfeito onde estiver, se quiser ir além. Se estiver satisfeito com o que já é, então já parou. Se disser ‘basta’, está perdido”. Agostinho, Confissões.

Não se desesperem por algo que possa estar morrendo neste ritmo em que o tempo que vivemos se parece com uma esteira rolante sob nossos pés.... Mas desde que saibam cuidar das sementes no solo em que poderão germinar. Desde que não se convençam que, com o passar das circunstâncias mutáveis da vida (às vezes nem tanto), vocês ficaram estéreis e não possam mais deixar sair outros meninos., outros moleques.

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