1 de agosto de 2010

Inferno

por Richard Bauckham

No início de 1996 um relatório pela Comissão de Doutrina da Igreja da Inglaterra foi publicado. Era um livro (chamado O Mistério da Salvação”) sobre a compreensão cristã da salvação. A cobertura na imprensa nacional ficou amplamente confinada a um ponto neste livro de 200 páginas: o parágrafo sobre o inferno. As manchetes típicas na imprensa eram: "o inferno vazio da Igreja" - "anciãos da Igreja derramaram água fria no fogo do inferno e da danação" - "Nós acreditamos no inferno, diz a Igreja (mas sem as chamas)."

Isso foi uma surpresa para os autores do relatório, que encaravam o parágrafo sobre o inferno como bastante incontroverso. Em qualquer caso, era uma parte muito pequena do seu relatório, que tratou longamente com muitas outras questões mais atuais, como o feminismo e a atitude da igreja para com as religiões não-cristãs, que não teriam ficado surpresos ao encontrá-los provocando controvérsias.

Grande parte do relatório é uma tentativa constante de fazer a compreensão cristã de salvação relevante e significativa no contexto da vida e sociedade britânicas contemporânea. A mídia nacional não estava interessada nisso. Para eles, a salvação significa escapar do fogo do inferno quando você morre, e assim o único ponto que vale a pena observar no relatório foi a sugestão de que a igreja estava abandonando a sua imagem tradicional de fogo e enxofre como o destino dos condenados.

De fato, o relatório pretende que o inferno seja levado a sério. Mas o inferno não é nada mais do que não alcançar a salvação. Não pode ser entendido como algo positivo em si mesmo. Só faz sentido como uma negativa: não ser salvo. A salvação não é evitar o inferno, mas sim o inferno que é perder a salvação. Então o inferno não pode ser entendido sem uma compreensão perfeitamente cristã e inteiramente positiva da salvação.

Há muitas maneiras de se descrever a salvação cristã. Uma forma que o relatório da Comissão da Doutrina adota é a seguinte: A Salvação é experimentar Àquele que é a Fonte e a Meta de todas as coisas como a Fonte e a Meta de seu próprio ser e viver. Salvação significa, em última instância, encontrar uma realização como ser humano em Deus. Os seres humanos são feitos para encontrar a realização, em última instância, somente em Deus. Salvação, tanto agora como depois da morte, está em conhecer a Deus.

Se este é o destino para o qual Deus nos fez, o inferno não pode ser uma espécie de destino paralelo, alternativo. O inferno é o resultado de uma recusa do destino para o qual fomos feitos e a única maneira em que a vida humana pode encontrar satisfação eterna. É uma possibilidade real e terrível, os seres humanos podem recusar o destino para o qual eles foram feitos. Isto pertence à seriedade absoluta a qual Deus leva para com a liberdade que Ele nos deu.

Nós não podemos dizer dogmaticamente se no final alguém vai escolher o inferno. Mas o inferno é uma possibilidade absolutamente grave a que as pessoas têm de ser avisadas. Ninguém deve supor que, embora recusando-se a conhecer a Deus agora, pode sempre mudar de idéia mais tarde. Como em todas as áreas da vida, nossas escolhas agora podem limitar as escolhas que podemos fazer no futuro.

O Novo Testamento usa uma variedade de diferentes imagens para descrever o inferno: o fogo é uma delas, a destruição uma outra, a exclusão da presença de Deus outra. Queimar no fogo por toda a eternidade é a imagem que ficou muito fixada no ensino tradicional sobre o inferno, como se fosse uma descrição literal. O Novo Testamento não nos obriga a pensar no inferno desta forma. O inferno não é uma câmara eterna de horrores através do caminho do céu. O inferno é o destino daqueles que rejeitam o amor de Deus. O amor de Deus não pode obrigá-los a encontrar o seu cumprimento em Deus, mas não há outra maneira para que eles possam encontrar satisfação. Excluem-se da Fonte de todo ser e da vida.

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