18 de julho de 2011

O Amor de Cristo nos Constrange

A Carta de Paulo a Filêmon


Esta carta possui proximidade imediata a Filipenses, pois Paulo está em cativeiro: Fm 1.9.13. Timóteo e outros colaboradores estão com ele: Fm 1.23.24. São condições de prisão comparavelmente mais amenas do que em outras circunstâncias, pois Paulo reúne-os em torno de si: Fm1.23, realiza trabalho missionário: FM.10. Fm 9 aponta Roma como local bem provável da redação. Outra possibilidade é a prisão de Paulo em Éfeso – 52-54, dada a proximidade entre Éfeso e Colossas, sendo que os destinatários estão localizados possivelmente na Frígia - Cl.4,17. Colossas seria lugar de residência de Filêmon.

Neste caso, há duas possibilidades muito diferentes do período da carta. Pode ser após o ano de 61 d.C., considerando que a ironia em Fm 19, indica Paulo com melhor humor do que em Filipenses, então pode ser logo depois desta carta. Ou por diversas razões de sincronização no estudo biográfico do apóstolo, pode ser no verão de 53 d.C. Paulo estaria aí com cerca de pouco menos de 60 anos quando escreveu.

Eu mencionei “destinatários”?.. O destinatário imediato é Filêmon, embora Paulo inclua todo um círculo próximo; não é uma carta privada, é destinada à Filêmon e à comunidade. Há todo um proêmio para sintonizar ouvintes e leitores de modo benevolente, envolver Filêmon em seu ser cristão ao insinuar que ele deve fazer o bem que é capaz de fazer 6.7. Nos versos 2.5.6, temos empregado os termos “comunhão” ou “comunicação”, que eram usados frequentemente para sociedades empresariais ou compartilhamento de posses. Filêmon era então o patrono da igreja local.

Podemos ver que Paulo se dirige a Filêmon como “irmão” e “colaborador”, não ao acaso. Faz parte essencial de sua conversa. Desafia Filêmon a romper com a antiga estrutura social padrão do lar e reconhecer em Onésimo um novo status social como irmão amado a partir de serem cristãos, sob seu status legal igual. Identifica-se explicitamente com Onésimo 12.16.17-20.

Por natureza escravos eram considerados pessoas, mas economicamente eram propriedades. Tinham melhor situação do que camponeses livres; às vezes juntavam dinheiro para adquiri liberdade, embora legalmente seus bens pertencessem aos mestres. Costumavam partir incumbidos como agentes com as propriedades dos mestres. Às vezes aproveitavam pra escapar.

A lei romana obrigava a devolver um escravo fugido; Deuteronômio 23.16 proibia, provavelmente com ecos do sentimento de já terem sido escravos! Há um conflito, e a questão não era apenas em relação ao critério de decisão de Paulo, mas com qual que Filêmon naturalmente partilharia. Ele não era um judeu.

Com a aplicação da lei romana, o escravo seria duramente castigado e/ou morto.

No verso 13, se mostra Paulo querendo que Onésimo fique com ele, para servir a ele e à pregação do evangelho. Quer o consentimento de Filêmon 14, pressupondo esse consentimento 21.

Reparemos um possível desfecho: em Colossenses 4.9 Paulo diz que enviaria Onésimo fiel e amado a Colossas...

Paulo usa na carta de diversas estratégias retóricas e recursos argumentativos estilísticos do seu tempo. A preservação da carta sugere que Paulo teve sucesso, pois não circularia se Filêmon não tivesse sido libertado.

Dado o contexto que vivia, não podemos reivindicar de Paulo um tratado abolicionista. Mas dentro do que ele apresenta em seu pensamento geral como nova pulsão ética para quem “está em Cristo”, trabalha no sentido de que o amor e alteridade que são os nortes do viver de Jesus e para quem quer viver com Jesus gera constrangimentos internos que desafiam a tomar atitudes. Esta atitude muitas vezes pode ser dissimilar ao que é convencionalmente aceito na sociedade. Pode extrapolar a “boa moral e costumes”, pode ser extravagante e superar o bom comportamento social corriqueiro.

Os legalistas e os fundamentalistas quando se deparam com um dilema destes, buscam se esconder querendo uma citação explícita de uma atitude a tomar ou não tomar. Assim durante muito tempo justificaram a escravidão, o machismo, a desigualdade social, e hoje ainda o usam para justificar muitos preconceitos e estigmatizações. Atitude destoante com a de Jesus que quebrou tabus ao tocar leprosos, o tabu da mulher se isolar socialmente devido aos seus ciclos naturais de menstruação, discipular mulheres, e dizer que o Reino era dos pobres entre os pobres.

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